Vieram os turistas e nós ficamos com dois sentimentos contraditórios: um de medo e outro de esperança. Na verdade eram os mesmos sentimentos que experimentávamos há tempos e, pelos vistos, ainda não deixamos de experimentar. Se por um lado temos medo que esta invasão turística possa ter consequências que nos obriguem a dar uns passos atrás, por outro lado temos a sensação de como ela é boa para a economia. Basta olhar para o rosto de quem lucra mais com esta invasão para aquilatar como a sua vinda é algo de benfazejo. Mas é preciso encontrar um ponto de equilíbrio entre estes dois sentimentos. Os sofistas não diriam melhor. Mas aqui, para este problema concreto, não existe o fiel da balança ou a sentença de Salomão. Não há ponto nenhum de equilíbrio. Ou se arrisca, ou se não petisca. Arriscar com prudência e alguma exigência de saúde é de boas práticas sanitárias, mas para petiscar há que abrir o país ao turismo, isto é, expondo-o a um contágio estrangeiro que sabemos existir em larga escala. Não se alimenta o menino ou deixamo-lo morrer à fome? Se fossemos governo faríamos exatamente como se está a fazer agora. Dar-lhe o biberão mas ter o maior cuidado com o que metemos lá dentro. Qualquer crítica em desabono é aproveitamento político em época eleitoral. Um dia um conde recomendava a D. Sebastião, O Desejado, que tivesse cuidado com a expedição que estava a organizar a Alcácer-Quibir; o rei, que não gostava de ser contrariado, como nenhum poder gosta, perguntou-lhe, com certa arrogância e azedume: “conde, de que cor é o medo”? “Da cor da prudência , real senhor”, respondeu-lhe o conde. A prudência tem a cor da prevenção. A do medo é de cor da cobardia. Julgo que este diálogo pode-se aplicar agora a nós que temos medo do contágio dos turistas e deveremos ter a prudência em admiti-los no nosso meio. Não há desonra em ter medo de os perder, mas há desonra em perdê-los. Eles vão chegando em caudal que não foi enxurrada, mas vêm satisfeitos por saírem dos seus países sombrios para virem gozar a plenos pulmões, este sol que desfecha seus raios ardentes na “tábua do peito”; são férias que não só satisfazem as exigências corporais mas também contribuem para equilibrar a mente. Estes turistas estão de olhos fechados, na cadeira de baloiço, onde pensam que a vida é bela e deve ser gozada em plenitude. Na verdade estas férias são diferentes das de há dois anos; representam simultaneamente o gozo da alma e o quebrar de algemas a que a pandemia nos amarrou. Como pássaros dentro da gaiola, mal a porta se lhes abriu, voaram ao longe à procura duma liberdade que cada um usufrui em subjetividade. São as andorinhas que vieram em época migratória procurar os velhos ninhos. Bem vindos e não se esqueçam de que em Braga também há ninhos.
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Na verdade estas férias são diferentes das de há dois anos; representam simultaneamente o gozo da alma e o quebrar de algemas a que a pandemia nos amarrou.
Autor: Paulo Fafe