O nosso país tem sido abalado por diversos casos mediáticos envolvendo a Justiça e os Tribunais. A questão não é nova, mas nos últimos anos os escândalos de corrupção, branqueamento de capitais, fraude fiscal e gestão danosa, entre outros, envolvendo políticos, banqueiros, empresários conhecidos e dirigentes desportivos, vão-se sucedendo, como uma telenovela gigantesca, sem fim à vista.
O mais mediático, o processo que envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates (Operação Marquês), ainda nem sequer começou a ser julgado após 7 anos de instrução. Em 9 de abril último, o juiz de instrução Ivo Rosa pronunciou a decisão instrutória sobre o processo, deixando cair as acusações da prática dos crimes de corrupção por prescrição e falta de provas. O ex-primeiro-ministro vai pronunciado apenas pela prática de 3 crimes de branqueamento de capitais e 3 de falsificação de documentos. A questão que se coloca é de quando terminará este processo que tem mais de 53.000 páginas e 13,5 milhões de ficheiros informáticos, sabendo que, seja qual for a decisão do tribunal, haverá certamente recursos para a segunda instância (Tribunal da Relação) e daí para o Supremo Tribunal de Justiça, Tribunal Constitucional, Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e sabe-se lá o que mais.
Esta semana o país foi novamente abalado (porventura o termo abalado é um termo demasiado forte para o que os portugueses têm sido habituados nos últimos anos), com a detenção do presidente Luís Filipe Vieira do Sport Lisboa e Benfica. Vieira foi detido na passado quarta-feira por suspeita de abuso de confiança, burla qualificada, falsificação, fraude fiscal e branqueamento de capitais. Segundo o DCIAP (órgão do Ministério Público a quem incumbe a coordenação e direção da investigação e prevenção da criminalidade violenta, altamente organizada ou de especial complexidade), os factos em causa envolvem o período de 2014 até ao presente e buscas em diversos locais relacionados com os restantes detidos (o filho de Vieira onde estão os empresários José António dos Santos, conhecido como “Rei dos Frangos” e o bracarense Bruno de Macedo).
De permeio temos muitos outros casos envolvendo personagens tão diversos como o empresário Joe Berardo, o juiz Rui Rangel ou o banqueiro Ricardo Espírito Santo.
As situações são sempre as mesmas e envolvem os alegados crimes referidos, entre outros, muitos milhões de euros, investigações morosas e complexas, com julgamentos igualmente complexos e tão morosos que ninguém sabe com certeza quando irão terminar.
Todos estes casos e muitos outros colocam a nu os graves problemas com que se debate o nosso sistema político e a nossa justiça, pondo mesmo em causa os fundamentos do Estado democrático, tal como o conhecemos. Aliás, para a rápida emergência de partidos populistas como o Chega, não será estranha a ocorrência destes casos.
Fundamentalmente, o que está em causa é a lentidão da justiça, as dificuldades na obtenção de prova nos casos da criminalidade dita de “colarinho branco”, o excesso de garantismos do processo penal que beneficia sempre os arguidos e prejudica sempre as vítimas e a sociedade no seu geral.
A impressão que passa para o cidadão comum, normalmente cumpridor e respeitador é a de que o crime compensa e somos todos um bando de idiotas, enquanto que os “xico espertos” vão enriquecendo e, mesmo quando são apanhados, a Justiça mostra-se incapaz de os condenar.
Temo que, se não for urgentemente efetuada uma reforma do processo penal, as coisas continuarão a descambar. Neste tipo de criminalidade, alguns dos princípios estruturantes do nosso sistema de justiça como sejam a presunção de inocência, o ónus da prova, a obtenção de prova, in dubio pro reu, prescrições e prazos, entre outros, têm de ser repensados e adaptados, sob pena do cidadão ficar com a impressão que os criminosos de “colarinho branco” escapam sempre porque o sistema foi desenhado à medida, para proteger este tipo de criminalidade e não a sociedade.
Até lá uma certeza: Quem paga a fatura do prejuízo que estes crimes causam ao país somos todos nós.
E, já agora uma pergunta: Alguém acredita que em todos estes processos a montanha vai parir mais do que um rato?
Autor: Fernando Viana