Sou a favor da liberdade de expressão porque coarctá-la é o mesmo que pactuar com a opinião única. Sempre esta liberdade foi perseguida, silenciada ou suprimida em governos ditatoriais por fomentar a diversidade de opiniões. Mas esta liberdade tem limites? Quando se colocam Marcar limites à liberdade de expressão é o mesmo que determinar “uma reserva de índios”? Não, mas a liberdade tem os seus limites. Não é porque sou livre que vou começar a insultar quem não gosto ou não admiro. O que aconteceu no programa Portas dos Fundos, através duma rábula natalícia, ultrapassa essa liberdade. É fácil fazer humor com a religião, basta reduzir à dimensão humana aquilo que é sagrado. Para isto não é necessário coragem, nem ineditismo; basta ter falta de caráter. O que aconteceu foi um ataque despropositado a Jesus e a Deus como se Eles não representassem para milhões de pessoas uma identidade e uma identificação, estas com valor intrínseco e íntimo tão altos que valem muito mais do que risos irónicos destes panteístas; foi uma emissão que feriu, sem necessidade, os milhões de católicos que por todo o mundo que têm em Jesus o seu Messias e em Deus a sua figura de Pai. Os senhores humoristas portugueses que enfileiraram com esta cobardia em prol duma liberdade que galgou o parapeito do respeito de milhões de católicos, devem pensar que a religião não é um anestésico como proclamava Marx, mas antes uma motivação para a orientação espiritual do homem no mundo. A fé tornou o homem num ser único, por isso a experiência religiosa de uma pessoa não pode, como é óbvio, ser observada por outra qualquer. E pergunto-lhes, porque não aproveitam a sua veia humorista para parodiar com os poderosos, para invetivar as prepotências, os snobismos dos novos-ricos, as regalias dos ladrões milionários, a falta de segurança nacional, as mazelas do ensino, as fraquezas do serviço nacional de saúde? Porquê? Porquê este silêncio pardo, estes biombos espessos que só se abrem contra os que não vos podem lesar? O vosso silêncio tem a cor da cobardia. É tão fácil ser-se forte com os mais fracos! É tão cobarde ser-se leão no meio de ovelhas! A religião, seja de que credo for, deve ser intocável porque pertence a estados de espírito que são, para quem nela crê, o único refúgio para as angústias, viveiro de esperanças, proteção terrena. Tem ninho privilegiado em cada um dos crentes. Magoá-lo em Jesus ou ridicularizá-la em Deus é ridicularizar a alma de milhões de crentes e ninguém tem esse direito. É templo do sujeito. Se Jesus fosse vivo, e vos ligasse alguma, teria dito: “Perdoai-lhes porque não sabem o que fazem”. O que digo do cristianismo, digo do hinduísmo, do maometismo, do judaísmo, e de todas as restantes religiões espalhadas pelo mundo. Os seus símbolos e práticas religiosas são igualmente para respeitar. Alá, Maomé, Buda, Confúcio, etc. etc. são para eles o que para nós são Deus, Jesus Cristo e Maria. Quero ter a liberdade de expressar a minha fé representativa sem constrangimentos ou medos de represálias ou ironias soezes. Há liberdade para ironizar mas não há liberdade para destruir a fé, seja de quem for. Ninguém deve destruir aquilo que não sabe construir. Mas também é verdade que estas coisas não se combatem com cocktails molotov; façamos-lhes, antes, compreender o que é o verdadeiro ecumenismo.
Autor: Paulo Fafe