Não, não se trata de falar a respeito do célebre quadro de Edvar Munch, mas como ele traduz a intensidade dos meus sentimentos a respeito da violência doméstica ou outras. Grita alto, muito alto e intensamente este sentimento de repulsa que congrega o aproveitamento do poder físico do homem sobre a debilidade física da mulher e dos filhos. Não custa ser leão entre ovelhas. É sempre o império da razão da força a sobrepor-se à força da razão. Quem usa do mais débil é um covarde.
Mas, por favor não limitem o mundo da violência, à violência doméstica, nem às sentenças do juiz Neto de Moura. O fenómeno de violência doméstica tem um cadastro atávico. Quase que foi cultura: “quanto mais me bates mais gosto de ti”!!! “entre marido e mulher não metas colher”.
Isto fez uma mentalidade. É preciso mudá-la. Sabemos que a mudança de mentalidades é como a água em pedra dura, mas, já que estamos em citações populares, vai mais uma: “água mole em pedra dura, tanto dá até que fura”. É preciso persistir com a gota. Há outra violência no mundo do emprego pela qual é preciso gritar bem alto: o emprego aos soluços.
Por vezes os patrões dão um ano de emprego e daí não passam porque o prolongamento até ao ano e meio já obriga justa causa para o despedimento. Ora se todo o despedimento fosse obrigatório justificar acabava-se com o emprego aos soluços. Se a violência doméstica desfaz muitas famílias, a lei que permite o emprego precário nem sequer as deixa nascer. Torna-se assim um aborto. Se isto não é uma violência doméstica, então o que é?
É uma habilidade sofística. Engana por palavras, aqueles que julgam que estão empregados; abala pela base o pilar mais forte da sociedade que é a família legalmente constituída por pai, mãe e filhos. Como podem casar dois jovens com emprego a seis ou doze meses? Temos todos de gritar contra esta violência laboral porque fomenta uma sociedade de velhos, e, deste jeito, rouba legalmente a natalidade.
A igreja que defende a vida, deve fazer evangelização neste domínio; deve fazer ouvir a sua voz contra este genocídio legal. Berra-se por aumento de ordenados, pela recuperação de tempo perdido, por melhores condições de trabalho, contra o não pagamento de horas extraordinárias e também berram contra a precariedade.
Mas é preciso gritar pela continuidade da raça portuguesa que ano a ano não consegue fazer a substituição geracional que tem como solução a procriação. Portugal envelhece e ninguém quer saber onde está o mal. Fingem ou fazem-se de fingidos?
A resposta é fácil: está no emprego a prazo. Como podem os jovens de hoje constituir um lar se não sabem como podem pagar a renda, a água, a luz, a alimentação, vestir e calçar?! Ter filhos para os ter à fome? Se os pais não têm futuro, que futuro podem ter os seus filhos? O fenómeno é de toda a sociedade, como se vai dizendo.
A sociedade é uma coisa abstrata, não tem rosto que se envergonhe, nem costas em que se possa bater. O que é real é que a falta de natalidade está na precariedade do emprego. O resto é conversa.
Por isso eu grito: não parem, por favor, de falar da violência entre portas, mas gritem contra a empregabilidade aos soluços.
Num estabelecimento privado, de saúde, de um dia para o outro, vi caras novas nos balcões de atendimento; perguntei pelos que lá estavam e responderam-me, foram dispensados. Foram despedidos porquê? Porque fizeram um ano de contrato!
Mas não desempenhavam bem as suas funções? Eram excelentes, mas tinham um ano de contrato, fora. Aqui, é assim!!!! Mas os que entraram de novo, vão ganhar menos do que os que foram chutados? Não, vamos ganhar o mesmo. Por isso eu grito.
Esperem um pouco mais: há ainda aqueles que se mantêm, há anos, a recibos verdes; coitados, nem sabem se são funcionários se “mulher a dias”, mas sabem que qualquer dia, um dia qualquer, o patrão lhes diz, acabou a “free lance>”, rua. Por isso eu grito.
Autor: Paulo Fafe