Até quando irá o primeiro-ministro António Costa conviver pacificamente com a dupla face dos parceiros de governação, comunistas (PCP) e bloquistas (BE): apoio no Parlamento e contestação nas ruas? Embora sendo através das estruturas sindicais, as vozes do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda estão nas manifestações, nas greves, nos protestos dos trabalhadores.
Ninguém se iluda, mesmo não passando de jogada política de bastidores, esta dicotomia de atuação não agrada e, muito menos, traz vantagens ao primeiro-ministro; porque o eleitorado do PCP e do BE, se não usufruir do concubinato, não vai gostar e claramente, castigará nas urnas os seus promotores.
Será que é por aqui que passa a teimosia de António Costa apostando nesta concubinagem mesmo que infiel? Ou, então, vai deixar andar até que os ventos lhe sejam favoráveis e sacuda os infiéis?
A meu ver, dada a atual contestação na rua e o volume de greves que se sucedem, a geringonça tremelica e não tarda a desconjuntar-se; e, as últimas eleições autárquicas foram já um aviso sério ao PCP e não o foram ao BE porque este partido não tem expressão eleitoral autárquica, pelo que o primeiro-ministro joga todos os trunfos governativos, antes que os parceiros lhe virem as costas.
E este comportamento acelera-se e aclara-se conforme se aproxima o fim da legislatura e o regresso às urnas, pois nem PS, nem PCP, nem BE querem perder eleitorado; e, se possível, pelo menos o BE gostaria nas próximas eleições legislativas ver um PS ganhador, mas sem maioria, e, assim, com ele poder fazer coligação, fosse parlamentar, fosse governativa.
Já relativamente ao PCP a contestação interna a esta fórmula de apoio parlamentar é evidente e, inclusive, o seu eleitorado mais fiel não se revê nas cedências que o partido tem feito ao governo e, muito menos, nos fracos resultados práticos alcançados para os trabalhadores; e Jerónimo de Sousa tem ultimamente endurecido a sua atitude para com o governo, mormente no virar de costas às suas exigências expressas na discussão do Orçamento de Estado para 2018.
Ademais, a meu ver, este estado de graça que tem gerido a geringonça só vai durar até à eleição do novo secretário-geral do PSD (Partido Social Democrata); porque seja o escolhido Pedro Santana Lopes, seja Rui Rio qualquer deles vai ser um osso duro de roer para António Costa e seu governo.
Depois, não são de excluir e, muito menos, desvalorizar as críticas e exigências que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, vai fazendo à geringonça relativamente à forma e oportunidade como governa e se entende nos momentos mais críticos, como, ultimamente, a propósito do flagelo dos incêndios; e, reconhecida como é a popularidade e intervenção ousada e oportuna do Presidente, ninguém o quererá ter como inimigo.
Ora, perante tais evidências, ou António Costa mais se encosta e cede a Comunistas e Bloquistas ou rompe de vez com a geringonça, tentando uma aproximação ao líder do PSD que sair da escolha dos militantes, na perspetiva de uma futura governação mais ao centro; é que, quer Santana, quer Rio ambos são exímios negociadores e manobradores políticos com quem António Costa se pode vir a entender muito bem.
Depois, após a renúncia de Pedro Passos Coelho à liderança do seu partido, instalou-se um certo desnorte na oposição ao governo, apenas, mitigado pela atuação de Assunção Cristas, líder do CDS/PP, nem sempre apoiada pelo PSD; e, assim, a geringonça, mesmo tremelicando e abanando, vai-se aguentando, alegre e despreocupada, apesar das vicissitudes e escandaleiras que, de Tancos ao Panteão, têm assombrado quase todos os ministérios.
Assim sendo, o cerco aperta-se para António Costa e seu governo e o tempo de decisão torna-se escasso; e, obviamente, o dilema impõe-se-lhe perentório: mantém ou desmantela a geringonça?
A ver vamos.
Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
O dilema do primeiro-ministro
DM
22 novembro 2017