1.Na passada Quinta-feira, comemorou-se o Dia Mundial do Riso, essa expressão de alegria e de aproximação que nos põe em comunicação com aos outros e cria laços afectivos e, a propósito disso, falava-se dos países considerados os mais felizes do mundo, à frente dos quais constava a Noruega, a Dinamarca, a Islândia, a Suécia, a Finlândia... Há coisas na vida que são maravilhosas, como um simples sorriso que é uma expressão tão poderosa que abre todos os corações.
Um sorriso fala do desejo de felicidade, que é um conceito muito apelativo e tão abrangente que envolve todas as dimensões da vida humana. Há dias, perguntava alguém porque é que, no início do ano (e também noutras alturas especiais), se formulam sempre votos de boa saúde, de bem-estar, de paz, de prosperidade, de Feliz Ano Novo e, quando já não se sabe explicitar mais nada, se diz, genericamente, votos de felicidade. A resposta é simples: porque temos o desejo inato de ser felizes, nascemos para ser felizes.
E como se demonstra essa afirmação? É a realidade que o demonstra. Basta olhar para ela. A felicidade funciona como íman que nos atrai. Todos sentimos esse magnetismo e todos temos prazer em correr atrás dela. Sentir esse apelo dá-nos uma expressão de realização pessoal que gera alegria, mesmo que, logo a seguir, já se sinta que precisamos de novas coisas.
Quer isto dizer que o desejo de felicidade nunca está totalmente realizado, nunca tem limites. É o sentido de infinito dos nossos desejos finitos. E quer dizer também que o desejo de felicidade está para além do nosso querer. Faz parte de nós. E tem marca universal de autor.
2. Não é por acaso que o Sermão da Montanha continua a ser chamado a Magna Carta do Cristianismo, porque se baseia nesse apelo irresistível da felicidade. Bem-aventurados os que… assim Jesus foi enumerando várias situações da vida humana, algumas que pareciam mesmo antagónicas da felicidade, garantindo que, para além do eventual íngreme caminho na vida, há um paraíso à nossa espera se formos capazes de confiar nele.
O discurso de Jesus começa sempre pelo apelo da felicidade: bem-aventurados… Era a palavra que todos os que sofriam esperavam ouvir da boca de alguém que podia cumprir aquilo que prometia. Depois, segue-se a concretização dessa promessa. A força do discurso das bem-aventuranças está nessa técnica de apelo, mesmo que depois se perceba a eventualidade de ser preciso algum sacrifício para o alcançar.
Anunciar a felicidade é o segredo para captivar a atenção dos ouvintes. Quem souber falar ao coração dos homens com a doçura de uma palavra que conforta e cura e der resposta aos seus desejos e necessidades tem o coração deles nas mãos. Pelo contrário, uma ideia exposta sem afecto e sem viabilidade de se tornar num projecto fiável de vida que possa trazer felicidade, não desperta interesse em ninguém. Sempre assim foi na História.
3. Foi neste cruzamento do apelo inato da felicidade com os sacrifícios que ela, muitas vezes, implica na caminhada da vida, que alguns, ao longo da História, confundiram sacrifício com felicidade e muitas vezes transformaram o cristianismo num anúncio triste de renúncia e de penitência que afastou as pessoas. Diziam até que, para ser santo, tinha de ter vocação para o sacrifício. Que disparate... Não há qualquer tendência natural para o sofrimento.
O sofrimento não atrai ninguém; pelo contrário, repele, porque magoa e destrói. A única realidade que atrai é a felicidade do amor. O amante pode percorrer longos caminhos para encontrar a sua amada, mas tudo lhe parece pouco ou nada quando finalmente a encontra. O que lhe dá prazer não é o sacrifício da caminhada, mas a alegria de a encontrar. Assim é a felicidade. E um sorriso que a anuncia e deseja. Sê feliz!
(O autor não escreve de acordo com o chamado Acordo Ortográfico)
Autor: M. Ribeiro Fernandes
O apelo da felicidade

DM
21 janeiro 2018