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Nossa Senhora no coração dos literatos

Logo que surgiram as “Aparições de Fátima”, muitos literatos escreveram sobre o grande prodígio verificado na Terra de Santa Maria, a eleita por Nossa Senhora para revelar, por entre as clareiras de uma frondosa azinheira, a sua mensagem a três humildes crianças, obedientes que pastoreavam os rebanhos num local onde primava a floresta repleta de pastos apetecíveis, garante do sustento de pequenos ou grandes rebanhos que se espalhavam pela serra. Eram, muitas vezes, as crianças que, nesse tempo, complementavam a vida do trabalho árduo e pouco rentável dos seus progenitores. Antero de Figueiredo (1866-1953), tal como António Sardinha, glorifica os acontecimentos prodigiosos da Cova da Iria com a sua publicação “Fátima”, procurando contactar com pessoas que tiveram a honradez de presenciarem o mistério, fazendo entrevistas, dialogando com os familiares e mais gente próxima do grande acontecimento de Fátima, reproduzindo a maneira genuína de se exprimir, a sua forma de sentir, de viver, escrevendo uma obra que nos transmite o retrato, mais ou menos fiel, das vivências daqueles povos. Diz ele, na introdução da sua obra: «E agora, antes de mais nada, que um fio de graça me prateie o caminho, logo, que perspicaz observação me mostre tudo que se aprende pelos olhos…» Inicia a obra contextualizando aqueles ambientes serranos e toda uma rusticidade e ingenuidade da rudeza do local e das suas gentes, transpondo, isso, com expressões e frases representativas. O seu livro tem um especial valor pelo retrato vivo do ambiente espiritual da serra. Vejamos alguns exemplos transcritos da obra que estou a ler e que foram selecionados pelos seus autores: A descrição da Lúcia quando Nossa Senhora se eleva da azinheira: «- Ia certinha, sem mexer os pés … e cada vez mais pequenina. Por fim, lá no alto, o Céu abriu e Ela desapareceu…» No que diz respeito ao pai da Lúcia, um pouco duvidoso, cheio do falatório da aldeia, termina o seu comentário com a palavra “mulherio”, revelando a sua aversão ao ruído que se gerou à volta da revelação daquelas crianças. O pai da Jacinta, homem mais crédulo das coisas sobrenaturais e, consequentemente, de tudo o que se estava a passar, relatou o que sentia com expressões que brotavam da sua alma bondosa e sensível: «- Iluminação dos mandos! Se fôssemos a distinguir, iríamos muito longe…Deus tem muita iluminação…Ninguém pode crer por si próprio, é preciso que Deus nos dê o íntimo!...» Narra-nos, ainda, a visão de Maria naquele cenário da Serra de Aire: «Ei-la! Aí está Ela, toda Ela, numa esfera luminosa de brilhante oiro em pó! Seus pés de rosa pousam em rústica azinheira … e seus lábios divinos movem-se para falar com inocente pastora. É formosa e meiga: doce e triste… Apareceu no seu próprio mês – o Maio florido, o Maio fecundo das sementeiras em terras amanhadas e lavradas… Aí a tendes em carne e em espírito, a verdadeira Nossa Senhora, Rainha do Céu e da Terra e de Portugal. O Seu trono é a Serra de Aire; a Sua Igreja Fátima; o seu altar a Cova da Iria; a sua pedra de Ara uma verde e humilde “carrasqueirinha” do monte… No centro da terra portuguesa, vê Portugal inteiro num relance circular dos seus olhos amorosos… logo eles pousam em memórias de façanhas, que sendo nossas também são suas, pois divinamente colaborou nelas; em grandezas monásticas que igualmente lhe pertencem por as haver apadrinhado. A Batalha – voto máximo de Aljubarrota; Tomar – igreja e castelo dos Templários; Ourém – solar daquele rústico e audaz guerreiro português que pôs a imagem da Virgem no balsão da sua Ala – Céu e Pátria! Alcobaça que lhe foi votada – claustro do saber e da beleza…» Termino com outra pequena transcrição do livro Meditações de Fátima, no capítulo “Os Aviadores em Fátima” de Pequito Rebelo (1892 – 1983), sociólogo, economista, lavrador, homem da ciência e aviador e muito crente no Além: «Mas a Fátima vão todos os caminhos e até os do ar… E os aviadores ali deixam cair a sua oração… Oração ardente … O aviador cristão, assim como, sendo aviador precisa de estar educado na manobra rápida, como o cristão deve educar-se na oração instantânea…» Principal fonte destas crónicas: “Fátima Altar do Mundo”, 3 volumes, sob a direção literária do Dr. João Ameal da Academia Portuguesa da História; direção artística de Luís Reis Santos, historiador de arte e diretor do Museu Machado de Castro, Coimbra; realização e propriedade de Augusto Dias Arnaut e Gabriel Ferreira Marques, editada pela Ocidental Editora, Porto, em 1953.
Autor: Salvador de Sousa
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7 novembro 2018