Antero Tarquínio de Quental (1842-1891), poeta, jornalista, filósofo do Romantismo, um sonetista de nome, um grande escritor, descendente de família nobre, nasceu na ilha de S. Miguel, nos Açores (Ponta Delgada). Ingressa, em Coimbra, no curso de direito, destacando-se pelas suas grandes capacidades e pelo seu inconformismo, vivendo entre “o sentimento e a razão, a sensibilidade e a vontade, o temperamento e a inteligência…”
Integrou uma das relevantes gerações de intelectuais portugueses, “Geração de 70” (Ramalho Ortigão (1836/1915); Oliveira Martins (1845/1894); Teófilo Braga (1843/1924 – 2.º Presidente da República); Manuel de Arriaga (1840/1917 – 1.º Presidente da República) e tantos outros), ligada à questão coimbrã, polémica literária entre os ideais românticos de Feliciano de Castilho e dos seus amigos e os jovens universitários da Universidade de Coimbra (1865), adquirindo, Antero de Quental, pelo seu talento e pensamento literário revolucionário uma popularidade e uma influência ímpar, sendo conhecido pelo “Príncipe da Mocidade.” A poesia e a prosa encetaram novos caminhos influenciados pelas chamadas Conferências do Casino.
Antero de Quental de um espírito contraditório, místico e descrente, impulsivo e apaixonado, mas, ao mesmo tempo, contemplativo, “a sua alma, que procura debruçar-se sobre a humanidade, afasta-se do humanismo cristão para se perder num idealismo abstrato e incongruente.” Mesmo assim, o seu coração vira-se para Nossa Senhora, escrevendo: «Num sonho todo feito de incerteza,/ De nocturna e indizível ansiedade,/ É que eu vi teu olhar de piedade/ E mais que piedade, de tristeza…//Não era o vulgar brilho de beleza,/ Nem o arder banal da mocidade…/ Era outra luz, era outra suavidade,/ Que até nem sei se as há na natureza…// Um místico sofrer… uma aventura/ Feita só de perdão, só de ternura/ É da paz da nossa hora derradeira…// Ó visão, visão triste e piedosa!/ Fita-me assim calada, assim chorosa…/ E deixa-me chorar a vida inteira!»
Finalmente, num estado depressivo grave, em junho de 1891, regressa à sua terra natal, suicidando-se, logo a seguir, no mês de setembro, com dois tiros, no banco do jardim, junto ao Convento de Nossa Senhora da Esperança.
João de Deus (1830/1896) que não se deixou influenciar pelos excessos do romantismo, nem com o elevado intelectualismo de Antero, expressando, sim, o que lhe vai na alma, repleta de sentimentos e de louvores a Nossa Senhora: «Virgem mãe do mesmo Deus!/ Virgem filha do teu filho!/ Não há estrela de mais brilho/ Nesses céus!...// Esse olhar é quem a mim/ Me encaminha e me socorre!/ O meu norte, é só a Torre/ De Marfim!
Outros escritores que, apesar de algumas controvérsias a nível religioso, não se afastaram da Virgem Santíssima, como: Gonçalves Crespo (1846/1883); Teófilo Braga, apesar das revoltas e da ideologia anticlerical da primeira república, não apagou Nossa Senhora do seu íntimo: «Salve! Rainha dos Anjos,/ Senhora Mãe dos Aflitos,/ No meio da tempestade/ Ouvis os cansados gritos…// Sois a doçura da vida/ O porto de Salvamento/ O vosso manto azulado/ se estende no firmamento…»; Guerra Junqueiro (1850/1923),, político, deputado, jornalista, funcionário administrativo de relevo, muito crítico em relação à Igreja. Na obra “Velhice do Padre Eterno”, uma poesia sobre a “Semana Santa”... «Guerra Junqueiro quis ser o último dos judeus que a 20 séculos de distância se junta aos deicidas do Calvário para lançar o escárnio dos seus vitupérios sobre o corpo exânime de Jesus!». Apesar de tudo isso, Guerra Junqueiro, vira o seu pensamento para Nossa Senhora e dedica uma das mais enternecidas líricas da poesia Marial. Quem sabe!... Magoado, de alma aflita, socorre-se da Mãe do Céu para interceder por ele junto de Deus, reflitamos: «Mas a sempre linda Virgem da Amargura/ baixa do “altarzinho”, toda afadigada,/ E através de serras, pela noite escura,/ De menino ao colo, Santa “Creatura”! – Lá vai ela andando, não tem medo a nada.// Lá vai ela andando… no caminho estreito/ Deixa um rasto de oiro pela escuridão…// Virgem das Angústias, Virgem da Bonança,/… Não vai ser parteira da ovelhinha mansa/ A parir balindo como uma criança,/ Entre fragaredos de meter horror!»
Principal fonte destas crónicas: “Fátima Altar do Mundo”, 3 volumes, sob a direção literária do Dr. João Ameal da Academia Portuguesa da História; direção artística de Luís Reis Santos, historiador de arte e diretor do Museu Machado de Castro, Coimbra; realização e propriedade de Augusto Dias Arnaut e Gabriel Ferreira Marques, editada pela Ocidental Editora, Porto, em 1953 e outras fontes.
Autor: Salvador de Sousa
Nossa Senhora no coração dos literatos
DM
13 setembro 2018