O período de Gil Vicente (1465?1536) e de Camões (1524?1580) constitui para a poesia portuguesa um sinal de magnanimidade e de alto fulgor. Gil Vicente dramaturgo, poeta… considerado a pai do teatro português e, até, ibérico, escrevendo também em castelhano, tendo a sua obra refletido bastante a mudança da Idade Média para o Renascimento; Camões foi uma das maiores figuras das letras portuguesas, o poeta da epopeia dos descobrimentos, um nome incontornável da cultura portuguesa.
Pouco estimado no seu tempo, mas elevado, ao longo dos séculos, como um dos maiores dignitários e imortal na literatura portuguesa. O período quinhentista, com estes e tantos outros homens de letras, não pôs de parte o culto a Nossa Senhora, inspiradora de tão ricas estrofes e outros textos com a riqueza, beleza e amor pela nossa Mãe do Céu.
Gil Vicente foi um dos grandes exemplos de elevação e de impregnantes louvores à Virgem, invocando os passos de Nossa Senhora, desde a Anunciação, Natal, Paixão de Cristo e de tantos outros: «… Oh Virgem! Se ouvir-me queres/ Mais te quero inda dizer:/Benta és tu entre as mulheres/ Nascidas e por nascer!...»; «Mansa pomba gloriosa,/Oh tão chorosa/Quando o seu Deus padecia! Oh! Lágrimas preciosas/De virginal coração (…) A advogada/ A força da nossa vida.» Aparece, ainda, pela primeira vez, como que fosse um prenúncio, sinal profético da Virgem de Fátima, no Auto de Mofina Mendes, o eloquente e majestoso título de “Senhora Peregrina”.
A poesia e a prosa continuaram, após Gil Vicente, a dar sinais de enriquecimento. A linguagem literária está a transformar-se cada vez mais, alargando-se o conhecimento de literaturas estranhas e antigas, ressurgindo, de uma forma mais humanista, o estudo dos clássicos greco-latinos. A própria Igreja sofreu vários dissabores com a reforma protestante e de tantas outras afrontas, tentando diminuir o poder papal e desejando revolucionar princípios do cristianismo. Surge a avidez do conhecimento de manuscritos literários classicistas de todo o mundo e , ao mesmo tempo, descortinam-se novos espaços geográficos, novos povos, tentando desvendar tudo o que estivesse ao alcance da nova corrente humanista.
Em Portugal, a religião não conheceu grandes perturbações nessa época, período dos descobrimentos em que os navegadores se faziam acompanhar sempre do Clero e de símbolos religiosos. A Cruz de Cristo, que seguia nas velas das naus portuguesas, era o símbolo principal e que sempre ficava nos locais descobertos e conquistados. Os missionários apregoam o nome de Cristo e da Virgem Nossa Senhora aos gentios. Os poetas e prosadores inspiram-se neste contexto de fé cristã, elevando ao alto os seus escritos, ajudando a espalhar a doutrina do Deus e a devoção à Virgem Santíssima que sempre professaram.
Sá de Miranda (1480-1558), “homem dum só rosto, uma só fé” que na Canção a Nossa Senhora exprime o seu enorme fervor e um sentimento profundo à Nossa Mãe do Céu: «…Virgem, horto precioso, alto e defeso/Rico ramo do tronco de Jessé/Que floresceu tão milagrosamente!/Custódia preciosíssima da fé…” António Ferreira, outro devoto da Virgem (1528-1569), depõe todo o seu fervor e entrega na Mãe Santíssima, como provam alguns dos seus escritos sobre uma romagem a um Santuário rústico: «A esta lapa vimos, Virgem Santa,/Humildes e devotos peregrinos…» e na Écloga do Natal: «Onde quer que o teu nome for ouvido/Tudo se alegre! Todos ledos cantem!/Seja nos Céus e Terra engrandecido…»
Principal fonte destas crónicas: “Fátima Altar do Mundo”, 3 volumes, sob a direção literária do Dr. João Ameal da Academia Portuguesa da História; direção artística de Luís Reis Santos, historiador de arte e diretor do Museu Machado de Castro, Coimbra; realização e propriedade de Augusto Dias Arnaut e Gabriel Ferreira Marques, editada pela Ocidental Editora, Porto, em 1953.
Autor: Salvador de Sousa