twitter

No dia em que a Igreja celebra S. Tomás de Aquino

Neste dia, muito chegado ao domingo das eleições, falar sobre elas creio que será feito por muitos especialistas, pelo que resolvi abordar um tema bastante diferente, relacionado com o santo que hoje, 28 de Janeiro, a Igreja celebra: S. Tomás de Aquino.

Falar desta pessoa não é fácil, sem se ser injusto. A ele todo o cristão deve, em muito os alicerces fundamentais do seu pensamento, não só no domínio teológico, como no racional, que a sua filosofia, baseada principalmente em Aristóteles, nos transmitiu.

Contudo, se olharmos para a carreira brilhante de professor indiscutível em várias universidades do seu tempo, como a de Paris e a de Colónia, para apenas citarmos duas, não podemos esquecer que Tomás foi sempre um homem muito humilde, que nunca chamou a atenção dos outros sobre os seus dotes intelectuais. Pelo contrário, fisicamente não era uma figura atraente. Por um lado, profundamente obeso, talvez por doença. E não falava senão quando o tinha de fazer, não gastando qualquer palavra que não fosse necessária.

Sofreu um sequestro de cerca de um ano, vítima da desaprovação dos pais e dos irmãos, membros da nobreza poderosa, que aceitavam que ele seguisse a carreira eclesiástica, a fim de prestigiar a família, sendo, por exemplo, o principal personagem de uma abadia de renome. Nunca, no entanto, como um frade mendicante, que ele abraçara como dominicano. E para o dissuadirem de modo concludente, na dependência onde o encerraram, meteram uma mulher de má vida, que, passados breves momentos, começou aos berros, com gritos de socorro, porque S. Tomás a ameaçou de modo inequívoco, com algumas brasas da lareira acesa. Apercebendo-se da inutilidade do seu isolamento, um dos seus carcereiros, creio que a mãe, deu-lhe oportunidade de se escapulir de maneira furtiva, o que ele aproveitou para voltar para alguma casa da sua ordem.

Foi aluno de Santo Alberto Mano, também dominicano, em Paris, que rapidamente descobriu que se encontrava perante uma cabeça genial. Ao contrário dos seus colegas que, pela sua gordura e silêncio persistente, o alcunharam de “Boi Mudo”. Um deles, perante o seu aspecto pouco atraente, depois de uma aula de temática difícil e complicada, não sei se orientada pelo mestre citado, sentiu pena dele. E, cheio de boa vontade, se prontificou a explicar-lhe o sentido do pensamento e do conteúdo daquela matéria tão árdua e complexa. Tomás aceitou a proposta. Ouviu delicada e atenciosamente a explicação. Agradeceu com sinceridade e, depois, com clareza, explicou qual tinha sido o seu entendimento daquela aula tão difícil. O companheiro ficou boquiaberto perante o que ouviu de Tomás e, penso, nunca mais pensou nele como um “Boi Mudo”, mas como uma mente privilegiada.

Santo Alberto Magno que, como se referiu atrás, o encarou como um discípulo excepcional, comentava aos seus alunos que os mugidos daquele a quem chamavam “Boi Mudo” chegariam a todos os extremos da terra. E assim aconteceu.

Era muito calado, o que, por vezes, servia de alvo da brincadeira, sempre amistosa, dos seus irmãos. Conta-se que, um belo dia, um destes resolveu meter-ser com ele, gritando de fora para dentro do convento, onde Tomás se encontrava naquele momento. “Frei Tomás, Frei Tomás! Venha ver um boi a voar!” O santo monge correu, apressado, para assistir a um espectáculo tão inusitado. E, claro está, não só não viu o que tanto o impressionara, como suscitou uma grande risota entre os religiosos presentes. “Frei Tomás, - perguntou um deles. Como acreditou no que lhe disseram?” E ele, com simplicidade, explicou: “Pareceu-me mais fácil que um “boi voasse” do que um frade mentisse...”.

Sendo tão simples, foi o autor de duas obras do pensamento teológico e filosófico, entre muitas outras, que são uma referência desde então, sempre actual e obrigatória, para todos os que estudam com seriedade e em termos de robusta fundamentação, não só a racionalidade da existência de Deus e das verdades do cristianismo, como também a sua fundamentação teológica. Referimo-nos à “Suma Teológica” e à “Suma contra os gentios”.

Homem de oração constante, é o autor, dum conhecido hino eucarístico, “Adorote devote”. Escreveu-o por incumbência do papa de então, que fez o mesmo pedido a S. Boaventura, outro grande representante do pensamento medieval. Consta que quando este leu o que escrevera S. Tomás, pura e simplesmente, achou por bem rasgar o que saíra da sua pena.

Morreu com 49 anos, em 1274, quando, por encargo do Sumo Pontífice, se encontrava a caminho do II Concílio de Lyon, na França.


Autor: Pe. Rui Rosas da Silva
DM

DM

29 janeiro 2022