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Ninguém muda as pessoas pela palavra, mas sim pelo exemplo

1. O Journal of Personality and Social Psychology publicou um artigo sobre o “efeito assumido de semelhança” no relacionamento interpessoal, assinado por Bradley Hughes, John Flourmoy e Sanjay Srivastava. Este artigo está relacionado com o saber milenar conhecido como “poder do exemplo”, que diz que ninguém muda as pessoas pela palavra, mas sim pelo exemplo. Especificando melhor, não apenas com palavras, com um discurso racional, mas sobretudo com exemplo e o carisma do comportamento. Este saber aplica-se em toda a interacção humana, no campo social, no campo político, no campo partidário, no campo religioso (sermões, homilias, acção social). Ao interagirem umas com as outras, as pessoas influenciam-se mutuamente, num sentido ou no outro. Quando duas pessoas se encontram pela primeira vez, tendem a ver uma à outra como tendo uma personalidade semelhante à sua: uma pessoa amigável e sociável tenderá a ver os outros como amigáveis e sociáveis; um tímido e reservado agirá inicialmente como se a outra pessoa também fosse assim. É aquilo que em psicologia se designa como “efeito assumido de semelhança”. É como se, quando têm de lidar com alguém desconhecido, as próprias pessoas usem as suas próprias personalidades para preencher as lacunas naturais do interlocutor. Há também o “efeito de dissimilaridade”: pessoas assertivas e dominantes geram nas outras um comportamento passivo; e pessoas passivas estimlam nas outras um comportamento mais assertivo. É um fenómeno muito observável sobretudo nos chamados pequenos grupos. Também visível em grupos maiores, onde os líderes mais assertivos escolhem como ajudantes pessoas mais passivas, que se mostram sempre concordantes com eles. Se acontece o líder dominante sair e suceder-lhe no cargo o líder secundário, de modo geral vai ter dificuldade em desempenhá-lo com êxito, porque lhe falta o suporte do líder dominante. Um outro fenómeno interessante é as pessoas tenderem a retribuir o comportamento umas às outras: por exemplo, uma pessoa que age de forma amigável e sociável tende a receber, em troca, o mesmo comportamento. 2. Voltando ao tema, em epígrafe, de que o mundo só se pode mudar pelo exemplo, não pelo discurso racional, é o poder de influência da afectividade através do exemplo. Porque a afectividade aproxima as pessoas e facilita o diálogo das ideias, mesmo quando são diferentes. Não porque aproximação signifique fusão da personalidade, como afirmava Sartre, porque o amor como fusão não é amor, mas dominação e dependência. Se não cultivar a independência, uma das partes acabará por tender para a dependência da outra, dificultando o crescimento mútuo, porque um possui e o outro é possuído. O amor pressupõe a independência de cada um. A aproximação apaixonada deve respeitar sempre a pessoa e a sua autonomia. Claro que há casos em que isto pode envolver outros aspectos de personalidade de que hoje não vamos falar aqui. Dentro deste campo, há um aoutro aspecto que vale a pena sublinhar: quando duas pessoas estão apaixonadas, tendem a imitar o comportamento uma da outra. E imitar tanto mais quanto mais intensa e profunda for essa relação de confiança e afectividade. Já devem ter reparado que um dos aspectos que revela se o casal vive mutuamente apaixonado é pela sincronicidade no andar, quando caminham juntos, como se fossem regulados por um relógio interno. Os seus sentimentos de amizade tendem a torná-los semelhantes. Isto acontece sobretudo em casais enamorados, mas também já o observei noutros tipos amizade. É o fenómeno da reciprocidade emocional. 3.Quando se diz que o mundo só se pode mudar pelo exemplo, isso não quer dizer que a palavra não tenha também efeito e poder. Só que esse poder depende do seu carisma e coerência afectiva, que só existe se estiver associado ao sentimento de amor que se expressa no comportamento. Sem isso, a palavra soa a oco… No fundo, esta experiência, feita agora no século XXI, é coincidente com aquilo que S. Paulo escreveu, no século I, acerca da “caridade”, na I Carta aos Coríntios, capítulo 13, naquele belíssimo poema ao amor, quando diz que “ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tivesse amor seria apenas como um metal que soa ou como um sino que tine. E ainda que tivesse o dom da profecia e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, se não tivesse amor nada seria”. Há dias, o cardeal António Marto escreveu que “não basta ao padre saber muito e falar bem se lhe faltar coração e humanidade”.
Autor: M. Ribeiro Fernandes
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19 dezembro 2021