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Ninguém leva a mal…

…porque é Carnaval, refere a expressão popular para amenizar eventuais excessos dos aficionados por esta tradição, de folia e mesa farta, vivida nesta altura do ano.

Tempos de excentricidade e descompressão que muitas pessoas precisam para, sem juízos de valor ou censuras, representarem papéis que no quotidiano não tomariam.

Alguns alvitram ainda que “a vida são dois dias e o Carnaval são três”, tal a importância que outorgam a esta festividade de tão antigos pergaminhos.

Neste contexto, ficaríamos menos sensibilizados se, genericamente, a Saúde e muito dos seus atores, em Portugal, se disfarçassem apenas nestes ditos três dias.

Aceitaríamos o disfarce da preocupante falta de medicamentos nas farmácias e nos hospitais assim como de uma estratégia, urgente e eficaz, de reserva destes produtos.

Engraçaríamos com a máscara alegórica que, candidamente, esconderia os preconceitos ideológicos e ignoraria o relevante e determinante facto de que o verdadeiramente importante não era se as unidades prestadoras de cuidados de saúde eram geridas pela iniciativa pública ou privada, mas sim se o SNS satisfazia com qualidade as necessidades da população. Recordaríamos, a título de exemplo, a auditoria do Tribunal de Contas à execução da PPP do Hospital de Braga, em 2016, onde se constatava que este hospital tinha já o custo operacional mais baixo, por doente padrão, de todos os hospitais do SNS.

Participaríamos no desfile pelo rol de serviços de saúde encerrados, por esse país fora, limitadores de uma das grandes conquistas do SNS: a possibilidade de serem obtidos cuidados de saúde que fossem considerados necessários, seguindo princípios de equidade dentro da nossa comunidade.

Compreenderíamos o jogral que se esqueceria de olhar para o envelhecimento e os impactos que decorreriam do aumento das comorbilidades das populações, da ausência de integração de cuidados, de forma permanente e humanizada.

Entenderíamos o traje arrojado utilizado pelos foliões que se faziam passar por médicos ou enfermeiras para colmatar e disfarçar a ausência destes profissionais nas instituições de saúde.

Fingiríamos que as notas de quinhentos euros e cheques chorudos com que os borguistas acenariam e afirmariam a pés juntos que serviriam para financiar novos equipamentos médicos eram verdadeiras.

Seriam três dias, onde tudo perceberíamos, tudo aceitaríamos… e nada, nem imaginação prodigiosa, faltaria para galhofar com a saúde dos portugueses.

Faltariam, porém, outros trezentos e sessenta e dois dias onde, aí sim, levamos a mal, muito a mal, a troca do real pela caricatura!


Autor: Mário Peixoto
DM

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21 fevereiro 2023