Querido Menino Jesus,
No dia em que esta carta é publicada completo, como bem sabes, sessenta e oito anos. E, tal como há mais de seis décadas atrás, antes de os meus primos mais velhos terem tido a veleidade de pôr em dúvida a transcendental autoria da dádiva dos presentes que eram depositados nos sapatinhos que púnhamos junto ao presépio, na noite de consoada, resolvi escrever-Te de novo. Não já para Te pedir as prendas com que sonhara durante o ano – e cuja entrega os meus pais tinham sempre o cuidado de lembrar ser condicionada ao meu bom comportamento, pelo menos nos dias mais próximos da grande data festiva… – e dizer da enorme alegria que teria se lograsse obtê-las. Mas agora para Te agradecer a permanente lição de vida e de humanidade que constitui o cerne espiritual do Teu nascimento.
É que à esperança no recebimento das tão desejadas prendinhas e à alegria das festas e brincadeiras com os familiares e amigos mais chegados sucedem, agora, a consciência e a vontade de aceder a uma outra dimensão da quadra natalícia que não a de carácter estritamente humano – a de uma profunda espiritualidade, centrada na prática pedagógica da vida em sociedade que, em boa hora, vieste dar à humanidade.
A humildade do estábulo que Te serviu de berço, a pobreza das vestes que primeiro Te cingiram, a doutrina do amor aos outros de que o Pai Te fez portador e personagem central e exemplar, condensando nela todos os anteriores mandamentos e o princípio fundamental de que todos os homens são irmãos e iguais aportaram à humanidade uma forma e uma dimensão verdadeiramente humanas.
Com as palavras, com as mãos, com actos, apontaste ao mundo o sentido da mudança e demonstrastes o poder da graça do amor. Ora esta revelação, que a Epifania e os Evangelhos se encarregaram de fazer ao mundo, não só não pode ser esquecida, como deve ser permanente lição de vida, motivo de constante busca do autêntico Menino Jesus no nosso coração e nas nossas acções e razão para uma contínua adoração ao Deus-Filho, ao Deus Trino e Uno, que vive e preside aos destinos do Universo.
Por isso, neste Natal, diferentemente de quando era menino, não Te peço nenhum presente. Quero antes ser eu a fazer-Te uma oferenda, justíssima e merecida, que só peca por tardia: abrir-Te o meu frágil coração, que é o meu tesouro, para que renasçais nele e para que a minha vida possa verdadeiramente ser agradável a Deus, a quem devo tudo o que sou e tenho.
E, já agora, se me é permitido, gostava de lançar o desafio aos homens de todos os tempos e de todas as nações para que, em 2018 e nos anos vindouros, usem os seus dons e talentos e a sua inteligência para alcançar o objectivo de fazer diminuir o fosso entre ricos e pobres e para que todos tenham acesso a cuidados de saúde condizentes com a dignidade humana.
Agradecendo a generosidade do Teu nascimento e o carácter redentor do projecto que Te dignaste encarnar, permiti que sejamos dignos da eternidade celestial e recebe deste Teu humilde servo um terno beijinho nos pés.
P.S.: A todos os leitores do D.M. desejo um Santo Natal e formulo votos de um 2018 pleno de saúde e de felicidades!22
Autor: António Brochado Pedras