1.Tenho diante de mim a mensagem do Papa Francisco para o próximo Dia Mundial das Comunicações Sociais que se celebra em 24 de maio.
Escreve logo no início: «Desejo dedicar a Mensagem deste ano ao tema da narração, pois, para não nos perdermos, penso que precisamos de respirar a verdade das histórias boas: histórias que edifiquem, e não as que destruam; histórias que ajudem a reencontrar as raízes e a força para prosseguirmos juntos.
Na confusão das vozes e mensagens que nos rodeiam, temos necessidade duma narração humana, que nos fale de nós mesmos e da beleza que nos habita; uma narração que saiba olhar o mundo e os acontecimentos com ternura, conte a nossa participação num tecido vivo, revele o entrançado dos fios pelos quais estamos ligados uns aos outros».
2.Os profissionais da Comunicação Social, particularmente os jornalistas, têm por missão narrar histórias. Tecer narrativas com o máximo de verdade e de objetividade.
O jornalista está, antes de mais, comprometido com a verdade. Deve ter a preocupação de trazer a público o que aconteceu, onde, quando e como.
Falsear a verdade ou inventar «verdades» é um erro grave que descredibiliza o autor do texto e do meio de comunicação que o divulga.
3.Comprometido com a verdade, o jornalista também está comprometido com os destinatários da mensagem, que deve servir com o máximo de honestidade. É um grande servidor da comunidade.
Divulgar a verdade e não a verdade que convém ou os aspetos da verdade que mais interessam a A ou a B.
Para que isto suceda o jornalista precisa de agir com o máximo de independência e de liberdade. Se, no exercício da atividade informativa, mais do que servir o destinatário da mensagem procura servir quem lhe paga ou o partido da sua simpatia pode comprometer seriamente a verdade. E às vezes acontece. Infelizmente. Os subsídios são um perigo. Como é um perigo a dependência dos anunciantes.
Informar com verdade também é respeitar o princípio segundo o qual os factos são sagrados e os comentários são livres. É resistir à tentação de misturar a narração dos factos com as suas opiniões.
Estou a lembrar-me dos relatores de jogos de futebol, que, muitas vezes, deixam a independência em casa e procuram puxar a brasa para a sua sardinha. Mas uma coisa é informar e outra, comentar factos ou emitir opiniões pessoais.
4.Escreve o Papa na citada mensagem: «Numa época em que se revela cada vez mais sofisticada a falsificação, atingindo níveis exponenciais (o deepfake), precisamos de sapiência para patrocinar e criar narrações belas, verdadeiras e boas. Necessitamos de coragem para rejeitar as falsas e depravadas.
Ocorre paciência e discernimento para descobrirmos histórias que nos ajudem a não perder o fio, no meio das inúmeras lacerações de hoje; histórias que tragam à luz a verdade daquilo que somos, mesmo na heroicidade oculta do dia a dia».
5.É evidente que, para informar, o comunicador deve estar informado. Deve saber selecionar credíveis fontes de informação que o auxiliem no exercício da sua atividade sem de forma alguma se aproveitarem ou a comprometerem. Deve, com firme delicadeza, recusar informações que interesseiramente lhe oferecem, a pretexto de lhe facilitarem o trabalho.
6.Informar com verdade. E tudo o que é verdade pode ser trazido para o domínio público?
Estou persuadido de que não. Decididamente digo que não. Há verdades que o comum das pessoas não precisa de saber. Que se não revestem de interesse para a comunidade.
Na missão de informar, o comunicador deve saber respeitar, por exemplo, o direito das pessoas ao seu bom nome, à sua boa fama, à sua privacidade.
No exercício da atividade informativa pode o comunicador defrontar-se com um conflito de direitos: o direito da comunidade a ser informada e o direto da pessoa ao respeito pela sua privacidade.
Perante tal situação, o informador deve saber qual o direito que prevalece. Pode ter em mão notícias interessantes que, por respeito à deontologia profissional, deve deixar na gaveta, ou até destruir.
Continuo na próxima quinta-feira.
Autor: Silva Araújo
Narrar histórias. Que histórias? 1
DM
14 maio 2020