Não gosto do período eleitoral. Entendo e sinto a propaganda como uma afronta ao meu raciocínio. No tempo em que foi preciso politizar, tempo em que não sabíamos nada de democracia, de partidos ou de sindicatos, julgo que a propaganda política foi útil. Foi tempo de nos dizer quem era quem e que sociedade pretendiam construir. Mas agora, passados 46 anos de liberdade, julgo que deve ser dada a liberdade para cada um escolher segundo o seu entendimento; a sociedade em que se quer viver deve ser escolhida sem coação ou pressão sejam elas de que género for. Gosto de pensar no silêncio do meu pensamento e não gosto que me pressionem seja por que motivo ou intenção for. Se depois de mais de duas décadas as pessoas ainda não sabem a sociedade em que querem viver, será que a propaganda política os vai ajudar a escolher? Julgo que a própria juventude, que não precisou de aprender o que era liberdade porque vive em liberdade e faz dela uma coisa natural, está suficientemente elucidada sobre o que quer ou não quer, sobre o que aceita ou repudia. Este tempo de debates televisivos só servem para se mudar de canal; este tempo de cartazes em escaparates espalhados pela cidade como uma praga, este tempo em que os partidos mais parecem sindicatos do que projetos de sociedade, tudo ressoa como tédio que faz bocejar. Os artigos de opinião vão no mesmo sentido; não há intervenção humana que seja isenta. A opinião é sempre tendenciosa, porque de âmbito subjetivo. Pessoalmente defendo-me destas agressões alheando-me por completo de qualquer dessas maneiras de fazer campanha eleitoral. É uma estratégia para me defender das agressões. É o meu castelo. Quando escolho, faço-o na convicção que a opção é minha e não dos comentários, não das entrevistas televisivas ou seduzido por cartazes apelativos ao voto na figura do cartaz. Este divórcio pessoal existe porque, em vez de ouvir os projetos de futuro para Portugal, oiço uma política de caraterísticas sindicais: melhor salário, mais férias, melhores reformas, menor desemprego. Ora, isto não é propaganda partidária. Esta deveria dizer-nos, por exemplo, qual o programa para a saúde, educação, segurança, justiça, forças armadas, liberdades de expressão falada ou escrita e, informar-nos quanto tudo isto custa e onde vão buscar o dinheiro. Estas questões fazem uma estrutura duma sociedade. O resto são remendos velhos num tecido puído pelo uso de 46 anos. Uma sociedade socialista, por exemplo, deve lutar pela apropriação dos bens de produção, pela anulação do indivíduo em benefício do coletivo, pelo controlo operário a terra a quem a trabalha; deve falar sobre a economia de estado em vez duma economia de mercado, duma educação instrumentalizada em vez duma educação livre. Estas são traves mestras duma sociedade socialista. Prometer mais isto e mais aquilo não é a essência de um partido; para isso, voltamos a reforçar a ideia, temos os sindicatos. Uma sociedade capitalista deve dizer-nos, por exemplo, que o lucro é mais importante do que as leis do trabalho, que o mercado não precisa ser regulado porque o próprio mercado já está regulado pela lei da oferta e procura, que as artes devem ganhar para elas em vez de se pendurarem no orçamento do estado, que os salários devem ser mínimos para os lucros serem o máximo, que o ensino particular é caro para estremar sociedades; deve dizer-nos que a sua sociedade se norteia pelo princípio de quanto tens, quanto és, nada tens nada és. A sociedade social-democrata é o meio-termo ente uma sociedade coletivista e uma sociedade capitalista. Talvez porque não queiramos ser escravos do socialismo, nem criados do capitalismo é que a sociedade portuguesa tem escolhido a sociedade social-democracia, na suas duas formas já experimentadas, PS ou PSD. Não em bloco central.
Autor: Paulo Fafe