A tal ponto de, um dia, ser acometido por um ataque de soluços, tendo-me sentido aflito por pensar que nunca mais paravam. Aflição, essa, que o meu saudoso pai aproveitara para me advertir: – Vês? É bem feito! Muito riso… pouco siso.
Intrigado coma preleção do meu progenitor, homem de risos contidos, fui procurar explicação sobre aquela coisa do “siso” – que eu pensava ser apenas um dente que só se manifesta a partir dos 17 anos – a um vizinho meu que andava no Liceu o qual, depois de uma útil consulta ao dicionário, me deu os seguintes sinónimos: juízo, tino, senso e circunspeção. O que me deixou deveras preocupado. Pois se o “riso” me tirava muito daquilo que eu pensava ter q.b., então havia que o refrear, dali em diante, para não fazer figura de tolo.
É que o meu amigo, quando lhe contei o que sucedera, ainda me deu a seguinte dica:
– Sabes que não nascemos a rir, mas a chorar? Depois, com as festinhas que nos vão fazendo, é que desatamos a rir. No entanto, não nascemos todos com propensão para o riso.
– Lição aceite, disse-lhe eu.
De facto, basta compararmos as figuras presidenciais de Ramalho Eanes com o falecido Mário Soares, ou as de Cavaco Silva e Marcelo Rebelo de Sousa – que exprime autênticas “overdoses” de afetos e algumas “bebedeiras” de “riso”, para percebermos esse fenómeno.
Hoje em dia, sejam eles ministros, deputados, edis, ou quaisquer outras figuras públicas, mesmo estando a falar das coisas mais sérias – para a vida do país e dos seus cidadãos – logo desatam às gargalhadas. Não é defeito mas, por vezes enjoa. Então quando é esperada contenção e respeito para com algo sério que está a ser discutido, os chamados assuntos de estado, logo surge o riso fácil e quase sempre jocoso dos intervenientes. Retirando-lhe algum sentido de seriedade, valor e credibilidade, dando a ideia a quem vê e assiste de que tudo não passa de uma brincadeira. Comportando-se, com o devido respeito pelas senhoras, como peixeiras que só querem vender o seu peixe.
Aos portugueses é que não lhes dá vontade nenhuma de rir quando as risadas entram na escandaleira nacional proporcionada pelos que foram e os que agora são Governo. Riem-se os do PSD do Ministro das Finanças, M. Centeno, por tentar encobrir o acordo que dispensaria António Domingues de declarar rendimentos. Pois se não existisse, nem sequer teria entrado na C.G de Depósitos. E ri-se todo PS e seus apêndices da esquerda de P. Núncio, Secretário de Estado do CDS, e do anterior Governo, por terem deixado escapar, pelas malhas do fisco, entre 2011 e 2014, 10,2 mil milhões de euros para os “Offshores”.
Povo, este, que já nem sabe como há tanta farinha para tantos comilões quando continua, ainda, a ser fustigado pela austeridade, só que de forma mais ardilosa. Aliás, uma ajuda à vidinha de quem lhes sobra capital mas sobre a qual todos – da esquerda à direita –, sabendo disso, nunca falaram claro sobre tais manobras.
Depois, quem quiser entrar na verdadeira “stand-up comedy” basta assistir a um debate na AR, em que os parlamentares procuram assumir compromissos – sérios – cansando os músculos risórios da face com tanto motejo. Para mais que irá surgir muita papagaiada vinda das “Comissões de Inquérito”, onde riem mais do que aquilo que apuram e a que é posto termo, sempre que não convenha ir mais além.
Ora, deixem-se de comédias e de ajudarem a promover a rapacidade no país. Porque comediante genuíno, eloquente e honrado foi o saudoso Charlie Chaplin que disse: «não estou interessado em “riso”. Apenas governei a minha vida com isso».
Autor: Narciso Mendes