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Memórias vivas e estáveis…

A celebração do Dia Internacional dos Museus, a 18 de maio, é sempre uma oportunidade para fazer memória das memórias vivas e estáveis que eles constituem. Tendo acontecido, nesse mesmo dia, a reabertura do renovado Museu Pio XII, reforça-se a oportunidade e a utilidade de uma reflexão sobre a identidade e a missão destas instituições culturais.

Os museus lançam as suas raízes nos ancestrais hábitos humanos de colecionismo e herdam o seu nome do templo das nove musas (mouseion, em grego), filhas de Zeus e de Mnemosine (divindade da memória), ligadas às diferentes artes e ciências: poesia épica, história, poesia romântica, música, tragédia, hinos, danças, comédia e astronomia. Era costume expor, nesse templo, as muitas oferendas que a ele chegavam, a fim de serem vistas pelos que o frequentavam, à procura de inspiração.

Na forma como hoje os conhecemos, os museus nasceram após o Renascimento. Presume-se que o museu universitário de Basileia (Suíça) foi o primeiro (1671) e o Ashmolean, na Universidade de Oxford (Inglaterra), o segundo (1683). Depois deles, foram surgindo aos milhares por toda a Europa e posteriormente por todo o mundo.

Um museu é “uma instituição permanente, sem fins lucrativos, ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público e que adquire, conserva, investiga, difunde e expõe os testemunhos materiais do homem e do seu ambiente, para a educação e o deleite da sociedade” (International Council of Museums, 2001). Não é, por isso, um mero repositório ou armazém de objetos, mas assume um papel importante na intervenção cultural e na educação do ser humano, no fortalecimento da cidadania e no respeito pela diversidade cultural. É o espaço ideal para despertar a curiosidade, estimular a reflexão e o debate, promover a socialização e a cidadania e contribuir para a sustentabilidade da cultura. Nesta ordem de ideias, é muito mais do que aquilo que mostra, até porque também faz parte do museu a conservação e o restauro, as exposições permanentes ou temporárias e a ação educativa.

Também a Igreja possui os seus museus e sobre eles se pronunciou a Comissão Pontifícia para os Bens Culturais: “um museu eclesiástico (...) está intimamente unido à vivência eclesial, visto que documenta de modo visível o percurso da Igreja ao longo dos séculos, no que diz respeito ao culto, à catequese, à cultura e à caridade. O museu eclesiástico é, por conseguinte, um lugar que documenta o desenvolvimento da vida cultural e religiosa, para além do génio do homem, com o fim de garantir o presente. Consequentemente, não pode compreender-se em sentido ‘absoluto’, isto é, separado do conjunto das atividades pastorais, mas sim enquadrado e em relação com a totalidade da vida eclesial e com referência ao património histórico-artístico de cada nação e cultura. O museu eclesiástico deve estar necessariamente inserido nas atividades pastorais, com o intuito de expressar a vida eclesial através de uma aproximação global ao património histórico-artístico” (A função pastoral dos museus eclesiásticos, 2001, Introdução). Como se depreende do texto agora citado, cabe-lhe a salvaguarda da memória (a conservação das peças, a investigação sobre a história da comunidade cristã e o encontro com as expressões culturais do território) e o serviço pastoral, dado que “serve para descobrir e reviver os testemunhos de fé das gerações passadas através de sinais sensíveis. Conduz-nos, além disso, à perceção da beleza diversamente impressa nas obras antigas e modernas, de modo que está destinado a orientar os corações, as mentes e as vontades para Deus” (Ibid., 2. 2. 2.).

Genericamente considerados, os museus são pontes ou lugares de conexão entre o passado, o presente e o futuro. Radiografias, permitem conhecer a história de um povo; grelhas de leitura, possibilitam compreender o presente; sistemas de navegação, ajudam a trilhar os caminhos do futuro. Memórias vivas e estáveis da vida e da fé de um povo, têm uma identidade própria e uma função múltipla.

Um povo que não conhece, não cuida e não se orgulha do seu passado não tem futuro. O mesmo pode dizer-se de um povo sem museus ou que os não frequenta. Visitar um museu não apenas dá vida e sustentabilidade ao próprio museu, mas também e sobretudo oferece a possibilidade de mergulhar na história, iluminar o presente e perspetivar o futuro.

*Professor na Faculdade de Teologia – Braga e Pároco de Prado (Santa Maria)


Autor: P. João Alberto Correia
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24 maio 2021