Venham mais gruas e menos garganta. Também fazia jeito haver peritos de agricultura para aconselhar as melhores práticas de passar das cinzas a terrenos aráveis. Penso que este exemplo do incêndio assassino deve também levar-nos a refletir sobre a futura construção de habitações nas zonas de floresta. Antigamente mendigava-se uns palmos de terra para construir a casinha, depois as fábricas de serração e ou indústrias transformadoras construíram próximo de suas matérias-primas. Tão próximas que se deitam nelas. Tão perto que é a mesma mancha.
Agora talvez fosse pertinente autorizar a construção mas com áreas de proteção, por exemplo, cada habitação deveria corresponder uma área de 50/60 metros de perímetro desflorestado; cada construção deveria ter um poço de água e um sistema de mangueiras e agulhetas que lhe permitisse fazer frente aos incêndios enquanto os bombeiros não chegassem. Onde não houvesse água não haveria construção. Estas dicas não resolvem tudo mas também não atrasam a reflexão.
Também ninguém constrói em cima de vulcões ou barris de pólvora. Por exemplo, e por semelhança com a preocupação contra incêndios imediatos, cada andar, vivenda de cidade ou vila, deveria ter um ou dois extintores contra incêndios domésticos, salvaguardando descuidos ou rebentamentos ocasionais de eletrodomésticos. Talvez se tivesse evitado a catástrofe daquela torre em Londres e da morte horrível se tivessem livrado aqueles mártires, se o dono do andar a quem rebentou o frigorífico tivesse um extintor para apagar de imediato as pequenas chamas, nunca elas tomariam as proporções que tomaram na Torre Grenfell.
Nada sei quanto ao ordenamento da floresta, mas sei que há bouças que sempre tiveram pinheiros bravos e mansos – era a lenha para as lareiras e fornos rurais, e nunca arderam desta maneira; outras não têm qualquer acesso a não ser se recuperássemos o tradicional carro de bois para galgar solavancos e ravinas; outras áreas pertencem a herdeiros desconhecidos, ainda há maninhos que pertencem a juntas de freguesia ou a ninguém! Não sei se o confisco do Estado aos terrenos abandonados, resolve muito disto.
Se os donos derem estes terrenos por perdidos a favor do Estado, como é que o este os vai dirigir? Vai roçar os matos, vai abater o pinheiro bravo e florestar com carvalhos, vai abrir acessos? Façam contas reais e não à base de estudos e estatísticas feitos no silêncio de gabinetes teóricos. A floresta é uma riqueza que os rurais antigos preservavam e nós agora desperdiçamos.
O lavrador sabia roçar para a cama das cortes, sabia desbastar os pinheirais para lenha, apanhava a caruma, as pinhas e canos secos como acendalhas, sabia que pinheiros eram destinados a madeira, retirava-lhe a resina, esgalhava os canos supérfluos, arrancava os raizeiros e lá plantava novas árvores; a limpeza da nossas florestas estava nas mãos deste labor. E agora nós, os da geração tridimensional, os sábios da tecnologia de ponta e nas pontas dos dedos, os da era de muitos saberes interplanetários, não somos capazes de preservar o que esses “labroscas” nos deixaram. Tenhamos vergonha porque os não merecemos.
Autor: Paulo Fafe