Sem contra-poder democrático, vamos resvalar no despotismo “esclarecido”. Como refere o art. 215.º da CRP-Constituição da República Portuguesa, “1. Os juízes dos tribunais judiciais formam um corpo único e regem-se por um só estatuto. / 2. A lei determina os requisitos e as regras de recrutamento dos juízes dos tribunais judiciais de primeira instância. / 3. O recrutamento dos juízes dos tribunais judiciais de segunda instância faz-se com prevalência do critério do mérito, por concurso curricular entre juízes da primeira instância.
/ 4. O acesso ao Supremo Tribunal de Justiça faz-se por concurso curricular aberto aos magistrados judiciais e do Ministério Público e a outros juristas de mérito, nos termos que a lei determinar”. Deste modo, os Magistrados Judiciais, juízes, são uma das figuras nucleares do sistema de Direito, social e democrático, mas também livre e verdadeiro. Esta é uma das normas que forma o Estatuto dos Juízes. Vamos seguir em parte as anotações dos Mestres Gomes Canotilho/Vital Moreira. Os juízes dos Tribunais formam um corpo único.
O “corpo de juízes” tem, portanto, uma função jurisdicional. É um corpo único. Não há qualquer relação de hierarquia entre os juízes, não se confundindo com as diferentes instâncias hierárquicas e Tribunais especialistas. Assim, o direito ao recurso e tendencial igualdade na aplicação do direito devem estar garantidas. O acesso à Magistratura Judicial passa pela nacionalidade portuguesa, a capacidade civil, uma certa idade, formação académica específica em Direito ou em áreas conexas com a área forense. Cabe ao Conselho Superior da Magistratura a nomeação de todos os juízes.
O acesso aos Tribunais de segunda instância ou Relação está apenas aberto aos juízes de primeira instância ou Comarca. Já o Supremo Tribunal de Justiça – não sendo um Tribunal de carreira, como os Tribunais de Comarca e de Relação –, tem regras próprias. Podem ter acesso juízes que não apenas da Relação, Ministério Público nos seus mais altos escalões e outros juristas de mérito, entre os quais professores de Direito e Advogados e afins. O acesso é por concurso público e não por antiguidade. Logo, será contra a Constituição o regime legal que procure limitar as candidaturas de juízes ao terço mais antigo dos juízes das Relações – considerados “candidatos automáticos”.
Assim, como será contra a Constituição estabelecer quotas de recrutamento pelas três categorias mencionadas em termos muito favoráveis aos juízes das Relações. Podemos também dizer que os critérios de acesso ao STJ, devem aplicar-se também ao Supremo Tribunal Administrativo. Ou seja, deve existir um concurso público, assim como se deve respeitar o princípio de abertura a outros juristas. Como noutras coisas da vida, não temos dúvidas que temos dos melhores Magistrados Judiciais do mundo. Qualquer excepção confirma de longe a regra.
Um juiz corrupto, ou um Magistrado do Ministério Público, a se provar, é porventura o grau máximo da corrupção paradoxal. Tem que ser punido como exemplo. E é justamente este “corpo único” que constitui um dos pilares fundamentais do Estado de Direito social, democrático, livre e verdadeiro. Face aos inúmeros casos de corrupção que têm sido expelidos pela comunicação social lusa e estrangeira, devemos sempre lembrar aos Magistrados Judiciais e do Ministério Público, no caso luso, que nós, o Povo, estamos convosco na procura duma Justiça cada vez mais perfeita.
Autor: Gonçalo S. de Mello Bandeira