Há alguns dia tive oportunidade de assistir num noticiário que passou em vários canais, ou seja, uma entrevista a um senhor reformado com a bonita idade de 80 anos que referia que depois de se ter reformado aos 75 anos, tinha decidido iniciar um novo capítulo da sua vida. Os filhos já se encontravam estabilizados, constituindo as suas famílias. Sentia que tinha de começar humildemente algo de novo com o intuito de alargar os seus horizontes. Aprender, adquirir novos conhecimentos, novas experiências. Optou por algo que, face à sua idade, não acreditaríamos que fosse possível, isto é, aprender ballet. Passaram-se cinco anos. Vimo-lo a dar uns passos, não interessa se melhor ou pior, já que acredito que a sua vontade não seria de todo seguir essa profissão. O facto é que ele tinha conseguido aprender. Dedicava agora cinco horas por dia a algo que o entusiasmava e de que muito gostava. São os novos tempos e as novas realidades. Com o aumento da esperança média de vida, torna-se necessário sentirmo-nos úteis, com objetivos, sob pena de estagnarmos. Há alguns dias tive uma experiência que me trouxe à memória este caso. Tinha vários assuntos para tratar, entre eles a renovação da carta de condução. Teria de ir à Loja do Cidadão, ao médico de clínica geral ao médico oftalmologista. Em resumo, toda uma serie de voltas por diferentes locais. Abri o roupeiro no sentido de escolher um fato casual, confortável, para poder movimentar-me à vontade, bem como uns sapatos que me permitissem ligar, se me permitem, o GPS e conseguir concretizar tudo o que tinha em mente. Deslocar-me-ia para os diferentes locais de metro. No metro completamente cheio, encontrei-me no meio de uma população muito jovem que se dirigia para o trabalho. Estranhamente, e pela primeira vez, devo dizê-lo, senti-me integrada no seu seio e acolhida. Ninguém me deu o lugar. Que bom, sinal de que ainda me consideravam ativa e em boa forma física. Com humildade fui ouvindo as suas conversas, os seus desabafos. Muito bem, estava a aprender. Parecia que tinha recuado no tempo e iniciado uma nova etapa de vida.
Também os casais hoje em dia trabalham muito, até tarde, as crianças nos infantários, nos prolongamentos de tempo, a chegada a casa tarde, com tudo para organizar, os banhos para tomar, os trabalhos da escola para fazer, o jantar para preparar, as roupas, as compras, as birras infantis, a educação os filhos, talvez as refeições para o dia seguinte... Na realidade não é fácil quando não existem apoios familiares e serviço doméstico. Alguém referia que tinha sido uma bênção quando podia contar com os pais já falecidos, que os ajudavam muito a tratar das crianças e mesmo todo o apoio ao seu lar. Compreendo agora melhor o porquê de procurarem um maior conforto no modo de se vestirem e de se calçarem, face a tantas ocupações diferentes, com pouco tempo disponível.
Só não compreendo mesmo a Lei da Eutanásia. Podem-me explicar, já que possuo algum grau de dificuldade em entender?
Sempre achei que se deviam promover as relações intergeracionais. Acho lindo observar os avós a ajudarem filhos e netos. Mesmo quando surge uma doença, ainda assim, os progenitores apesar do trabalho acrescido que possam dar, conseguem ainda ser uma bênção. Quase me vêm as lágrimas aos olhos, quando vejo um casal de idosos unidos, de mãos dadas, que venceram toda uma vida em conjunto, com os seus altos e baixos, na saúde e na doença, nas alegrias e na tristeza. Ontem fui almoçar com uma amiga que se encontra num lar. Tem quase 99 anos e uma alegria de viver, de se sentir útil. Constitui um prazer estar na sua companhia, ouvir as suas histórias e mesmo levá-la a passear, às compras… Referiu já adaptada, que o lar agora era a sua nova casa. E foi-me referindo as histórias das suas novas amigas, das aulas de ginástica, dos trabalhos manuais, de alguns jogos, das crianças que vinham interagir com eles…, enfim, toda uma panóplia de atividades que a mantinham ativa. Durante algum tempo mantivemos um diálogo profícuo. Como sempre tinha na sua companhia um amigo, ou seja, um livro já que adorava ler. Pensei interiormente que esta oportunidade deveria ser concedida a todos os idosos, que não deveria constituir um privilégio, isto é, torna-se necessário lutar para que se alcance este objetivo. Resolvi questioná-la sobre o que pensava da eutanásia. Respondeu-me: é uma morte aplicada e até que ponto a pessoas têm direito de retirar a vida que é única e irrepetível e intransmissível - a alma. Acrescentou ainda que temos de apreciar a vida, passar pelas dificuldades de cara alegre, porque depois teremos a recompensa. E mais não disse sobre um tema que a entristecia.
Para concluir este artigo, menciono a declaração conjunta assinada em Lisboa, no dia 16 de maio de 2018, por representantes de cristãos, muçulmanos, hindus, judeus e budistas unidos contra a eutanásia, defendendo a aposta nos cuidados paliativos e no acompanhamento dos doentes terminais, rejeitando, a legalização da eutanásia, em Portugal: “Em nome da humanidade e do futuro da comunidade humana, causa da religião, sentimo-nos chamados a intervir no presente debate sobre a morte assistida, manifestando a nossa oposição à sua legalização em qualquer das suas formas, seja o suicídio assistido, seja a eutanásia”.
Termino acrescentando uma frase de um grande amigo já falecido com idade avançada, sempre a lutar pelo bem da humanidade, em particular pela defesa dos mais idosos, que o título deste artigo referia, ou seja, a idade a avançar, constitui uma “Juventude Acumulada”. Talvez tenha chegado a ocasião de mudarmos a nossa visão sobre os idosos.
Autor: Maria Helena Paes
Juventude Acumulada
DM
30 maio 2018