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JUSTIÇA: UMA AUSÊNCIA IMPERDOÁVEL DOS DEBATES ELEITORAIS

Quem se predispôs a assistir aos debates televisivos das legislativas antecipadas do próximo dia 30 por certo terá notado que os principais problemas da justiça estiveram ausentes das temáticas afloradas pelos debatentes e das questões colocadas pelos moderadores. Porquê essa omissão quando é certo tratar-se de matéria que constitui um dos pilares fundamentais da democracia e do Estado de direito e que é estruturante de um dos poderes soberanos da Nação?

Confesso aos meus estimados leitores que, por mais que cogite na questão, não consigo encontrar uma resposta simples e lógica. Será que o vigente sistema político-partidário pretende manter a situação para protecção de interesses inconfessáveis? Será por incompetência? Será para não ter que assumir culpas indisfarçáveis? Ou será por medo de enfrentar os poderosos lóbis que corrompem e manietam a nossa vida pública? Seja por que for, uma coisa tenho por certa: quando o povo perde a confiança na justiça, nas suas instituições e nos seus agentes, fica em crise a moral e a ética que devem imperar na vivência colectiva e, mais do que isso, a própria liberdade dos cidadãos.

É por isso que se impõe aos partidos que disputam eleições legislativas uma séria reflexão sobre os problemas da justiça e a apresentação de soluções e de políticas públicas adequadas à sua resolução.

É apodítico afirmar que, para o governo socialista, o sector da justiça não foi prioridade. Faltam juízes, faltam magistrados do Ministério Público, faltam oficiais de justiça, faltam meios técnicos auxiliares, faltam novos investimentos em recursos materiais, designadamente em edifícios (tribunais, estabelecimentos prisionais, centros educativos, etc.) e meios informáticos. E sobram gravíssimos problemas: bloqueio económico no acesso à justiça, traduzido em custas altíssimas e em apertados critérios para obtenção de apoio judiciário; sucessivas prescrições de crimes de corrupção e de grande criminalidade económico-financeira, que inculcam consistentemente a noção de haver uma justiça para ricos e poderosos e outra para cidadãos comuns; contínuas violações do segredo de justiça e persistentes fugas de informação que permitem julgamentos em praça pública e servem de mecanismo de defesa de magistrados; uma morosidade extrema nos processos do foro administrativo e fiscal cujo tempo médio de pendência excede a dezena de anos; excesso e má qualidade da produção legislativa; e urgente necessidade de revisão, modernização e simplificação das leis processuais.

Perante este desolador panorama, o que se esperava dos partidos políticos é que se apresentassem a estas eleições legislativas com programas consistentes e ideias claras que privilegiassem a área da justiça, propondo políticas e soluções concretas para resolver ou minimizar os referidos problemas. Infelizmente, não foi esse o caminho escolhido pelas diversas forças políticas concorrentes, mormente daquelas com capacidade para vencer a pugna eleitoral.

Discutir a composição dos Conselhos Superiores da Magistratura e do Ministério Público como condição da independência das duas magistraturas e como magna questão do sector em causa é, salvo o devido respeito, não ter a noção do que verdadeiramente afecta os tribunais e a realização da justiça.

Instemos, pois, os partidos concorrentes a corrigir a falta de centralidade do debate no tema da justiça por forma a permitir aos eleitores uma escolha informada também nesta matéria.

Tão importante quanto o exercício do direito ao voto é o acesso ao Direito e à Justiça. Que ninguém duvide disso!


Autor: António Brochado Pedras
DM

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21 janeiro 2022