Alguém comentava que o importante não era tanto proibir moralmente a prática da interrupção voluntária da gravidez – forma eufemista de não falar da morte provocada de um ser humano indefeso, que é o filho que germina no seio materno –, mas de repelir e condenar com firmeza as guerras dos nossos dias, que matam tantas crianças indefesas. “Por onde anda a Igreja? E o que dizem os seus “leaders” responsáveis?” Inquirem. “Quanto bem não faz, assim, a ONU, ao promover a contracepção em todas as suas formas, que evita tantas vidas condenadas à infelicidade e à fome com antecipação”.
A Igreja faz muito e esquecê-lo é querer fechar os olhos e os ouvidos a tudo aquilo que ela ensina e promove. Não apenas agora, mas desde que a vimos expandir-se, após o Pentecostes. Tenhamos presente, em particular, nos nossos dias, os escritos do Papa Francisco, com os seus apelos sistemáticos à paz entre os homens e o seu desejo concreto de acudir, tanto quanto lhe é possível, às situações inumanas provocadas pela injustiça social e as guerras que afectam as diversas sociedades na actualidade. Quanto à ONU, foi criada para os homens viverem em concórdia uns com os outros. Apoiemos estes seus esforços e agradeçamos o que a ela devemos nesse campo. E peçamos aos que a dirigem que as suas tropas – presentes com frequência em países pobres e de miserável desenvolvimento social –, garantam a dignidade e a segurança das populações afectadas e não sejam veículo de abusos sexuais, como já foi noticiado.
Em relação ao passado, eis um tema habitual de desconfiança a respeito da Igreja: a Inquisição. Não é, decerto, o assunto mais atraente e singelo, para perceber, em toda a sua grandeza, os esforços de convivência fraterna que os católicos e os seus dirigentes devem protagonizar ou protagonizaram. Mas falar desta instituição sem ter em conta a mentalidade, os costumes e as situações político-sociais dos tempos em que ela existiu, aplicando-lhe, sem sentido crítico, os moldes de procedimento que hoje nos orientam, é injusto, em primeiro lugar, e manifestação de ignorância histórica imperdoável. Além de que, com facilidade se atribuem à inquisição católica condenações e punições de que ela não tem qualquer responsabilidade. Por exemplo: a perseguição e uma mortandade muito considerável, que a igreja de Lutero levou a cabo, na Alemanha, aos chamados “Anabaptistas”. O mesmo se diga da morte de mais de mil mulheres escocesas, entre 1555-
-1561, que a inquisição reformista levou a cabo. Enfim, convém recordar que o médico espanhol Miguel de Servet, que tanto contribuiu para o entendimento da circulação sanguínea, foi condenado na Suíça pelos apoiantes de Calvino e não pelos inquisidores da Igreja de Roma. Muitos outros casos não são difíceis de rememorar.
Insistimos: cuidado com os juízos sem sentido histórico, com os factos que se apresentam levianamente, e com os números. Agrada-nos a Inquisição Espanhola? Decerto que não. Nos seus vários séculos de existência não lhe imputemos, porém, superficialmente a condenação à morte de muitos milhares de pessoas. Os arquivos históricos apresentam-nos, ao que parece, 125.000 processos, dos quais apenas 59 punidos com a pena capital.
Um marxista que fala com sobranceria da Igreja Católica e da sua inquisição, não se esqueça deste pormenor: os regimes comunistas, que não vigoraram na Idade Média ou no Renascimento, mas em pleno século XX, dominando muitas nações com implacáveis ditaduras, são hoje apontados pela história séria que os conseguiu investigar como os causadores do desaparecimento desta vida de mais de cem milhões de pessoas...
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva