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Intersubjetividade e identidade – importância do afeto

O conhecimento não é uma cópia da ordem externa, é uma expressão da capacidade que cada organismo tem de ordenar e auto-organizar a sua experiência. Os organismos são exploradores ativos do mundo e solucionadores de problemas, portanto, todos os organismos aprendem. Uma abordagem ontológica do conhecimento humano leva-nos ao ponto de vista do sujeito que possui a experiência de quem a vive. Como observadores, somos nós que introduzimos a ordem na realidade que observamos, sendo esta ordem o reflexo da nossa subjetividade. Não conhecemos a realidade, conhecemos a nossa experiência nela. Como primatas, vivemos em intersubjetividade – entenda-se por tal: o mundo em que o conhecimento de mim mesmo é sempre dependente do conhecimento dos outros, onde tudo o que sei sobre mim e o mundo depende de como conheço os outros e de como me sinto visto por eles. Compreenda-se que, nesta intersubjetividade, a questão da identidade como elemento que nos distingue, torna-se uma condição para a preservação da própria vida. A sobrevivência de um ser afetivo que vive uma experiência intersubjetiva torna-o dependente da sua capacidade de reconhecer os estados emocionais dos outros e a sua capacidade de expressar e simular os seus próprios estados emocionais. Vivenciamos a intersubjetividade desde o primeiro momento das nossas vidas. Um/a bebé recém-nascido/a, logo após algumas pouquíssimas horas, já é capaz, não só de estabelecer um relacionamento, quanto de imitar o comportamento gestual dos adultos que se aproximam dele/a – mesmo que a sua visão seja ainda nublada. Para um sujeito pertencente a uma espécie em que os processos de vinculação são tão importantes, a qualidade da relação emocional com os outros é outra condição da experiência, uma vez que a própria sobrevivência depende dela. O reconhecimento da face é de vital importância no processo de individuação dos primatas, especialmente do primata humano. A primeira coisa que uma criança faz ao entrar em uma sala desconhecida onde há brinquedos, não é ir brincar, é olhar para o rosto da sua mãe para reconhecer na sua expressão o que a situação significa. A criança sentir-se-á confiante se vir na sua mãe uma expressão calma e relaxada, muito mais se estiver a sorrir. Se a mãe se mostra estressada, apreensiva ou com expressão de medo, a criança vai-se aferrar a ela à procura da sua proteção. A reciprocidade e interdependência dos ritmos psicofisiológicos entre a criança e seu/sua cuidador/a estão intrinsecamente relacionados, orientando tanto a atividade da criança quanto o ordenamento da perceção de si e do mundo, sendo que cada perceção e reconhecimento dos outros influencia diretamente na sua própria auto-perceção. A criança torna-se progressivamente consciente de si mesma ao ver o seu reflexo no «espelho» da consciência que os outros têm dele/a. É na reciprocidade afetiva com os vínculos significativos onde se constitui a organização de um domínio emocional individual que, em última instância, será a base material sobre a qual será construída, durante o seu desenvolvimento, a experiência de um sentido pessoal unitário, contínuo e viável. Portanto, é de destacar que o conhecimento humano, como auto-organização complexa da própria experiência, não é apenas de ordem cognitivo. A matriz dos significados que o pensamento processa é sempre de ordem afetivo-emocional. Nos seres humanos, como em outros mamíferos, as emoções dão um sentido imediato e global do mundo e da nossa situação nele. As nossas experiências são caracterizadas pela necessidade de organizar as nossas tonalidades emotivas relacionadas aos processos vinculares, em torno de uma autoidentidade diferenciada, reconhecida pelos outros e aceite como válida por nós mesmos. Passamos um período muito longo das nossas vidas em situação de «criança», a qualidade da relação emocional é da maior importância. Mas, não o é só em relação às necessidades afetivas básicas de contato próximo com os nossos progenitores, não está presente apenas no recém-nascido/a e no/a bebé, mantém-se ao longo de toda a vida. Referências bibliográficas: Balbi, J. (1994) Terapia Cognitiva Pos-racionalista. Conversaciones con Vittorio Guidano. Buenos Aires: Psicolibros Ed.
Autor: Pável Modernell
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27 julho 2019