Aproximam-se as eleições autárquicas. Nestas, como noutras, perfilam-se candidaturas ditas independentes. Segundo a CNE serão mais de mil, num recrudescer de forma consistente de ano para ano eleitoral. Digo ditas independentes, porque na sua essência, na sua génese, poucas são aquelas que, verdadeiramente, preconizam o sentido dessa realidade para a qual vamos despertando com a consolidação da democracia. Esta vertente independente seria a participação de todos aqueles que não estão filiados num partido e de nenhum depende na sua actuação. Na abertura legal e constitucional (esta com a revisão da Constituição em 1997) para a este tipo de candidaturas, concorre a ideia apelativa de eleições centradas, mais no candidato, do que nos partidos. Com uma acuidade nas eleições autárquicas em que se pretendem, idealmente, pessoas que saibam exercer o poder local, competentes, livres de interesses pessoais e com objectivos que sejam, tão-só, o serviço à causa pública, à busca da melhoria das condições de vida dos seus concidadãos. Visava-se o aprofundamento da relação mais directa entre os cidadãos e as suas instituições, bem assim afastar o crescente divórcio entre eleitores e eleitos. A independência seria uma nota de neutralidade, liberdade e imparcialidade partidária. O problema é que a independência pensada e anunciada raramente é a efectivada. Ela assenta, muitas das vezes, mais do que num apelo cívico de pessoas, de novos actores políticos desprendidos partidariamente, em dissidências partidárias mais ou menos publicitadas, na procura de alcançar projectos pessoais ou de grupo que não tiveram – sejam quais forem as razões – acolhimento no quadro organizativo de partidos. Vemos, muitas vezes, candidaturas que gravitam neste quadro para melhor fluírem entre apoios consoante as marés, rejeitados dos partidos ou das suas vontades pessoais, porque foram afastados, preteridos, alheados de um qualquer lugar ou posição. Há, naturalmente excepções – poucas – e há até aqueles militantes que vão no canto da sereia da solidariedade pessoal, de uma amizade, de um compromisso, na inocência de um projecto que alguns intitulam de cívico. Uns quantos esquecem mesmo – alguns sem mácula ou lembrança – de que, pertencendo a um partido, têm deveres próprios de militância. Deveres imprescindíveis para o exercício partidário e democrático e que, sem eles, se ceifaria parte do conceito da democracia. É verdade que os partidos têm, por vezes, culpa por não saberem acolher ou acomodar, conciliatoriamente e sem imposições de parte a parte, alguns dos seus membros e ideias, mas quem seja militante não pode ignorar esta sua condição; alguns até, porém, reivindicam o estatuto de militantes e depois não cumprem com regras fundamentais desse mesmo estatuto, o respeito e lealdade. E se há casos daqueles que antes de enveredarem por esta via se acautelaram e retiraram as ilacções que se impunham, outros tantos ou mais, não podem esquecer as consequências de um apoio explícito ou, bem mais grave, da participação em listas ditas independentes contra outras do seu partido em que se inserem. Aí, por muito que custe, por muito que percebamos o apoio ou participação em razão de ideias sinceras, solidárias ou outras, não é aceitável a manutenção de um vínculo partidário aguardando que os partidos nada façam – daquilo que é seu estrito cumprimento do que se impõe – em sede de responsabilidade disciplinar a que se comprometeram respeitar e, assim, se vitimizando num futuro próximo. Estes não podem, volvidas as eleições, pretender manter-se como estavam, como se nada tivesse ocorrido e querendo o sol e a lua em simultâneo. Não se trata de defender purgas ou perseguições. Não se pode é estar com um pé num lado e outro noutro, consoante as modas, os orgulhos, as vaidades pessoais ou o sentir de cada momento. Os militantes têm de saber conviver com as regras dos seus partidos e da democracia. Se se dizem independentes, sejam-no de facto.
Autor: António Lima Martins