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Há sangue no capim

Sempre que se fala ou se escreve sobre Moçambique, oiço ou leio com sofreguidão, com toda a força do meu ser, pois, apesar de ter sido obrigado ao serviço militar nesse país cerca de trinta meses, muito amei Moçambique, as suas gentes e todo o seu espírito de liberdade – é a África! Servi o Exército português em Cabo Delgado e Niassa, sobretudo neste, porque mais tempo lá vivido. Da vila de Namapa a Montepuez, de Macomia à Mueda com o fim de chegar a Nangololo, conheci essas povoações e infelizmente com o sofrimento da guerra que se lá vivia. Já no meu tempo, há mais de cinquenta anos, estas localidades tinham os alicerces para darem grandes vilas ou vilas muito grandes, devido aos bens materiais que se adivinhavam no seu solo – é a África! No distrito do Niassa, desde o Rèvia a Maúa e desde Marrupa a Pemba, era trajecto por mim bem conhecido, bem temido e muito, mas muito sofrido pela guerra no terreno. Fome, falta de tudo e excesso de balas frias de quentes armas e dor, era o que havia a caminho do Rèvia a Pemba. Conheço muito bem a zona de guerra criada pelos Jihadistas do Daesh, esses terroristas que têm sede de sangue, que têm como alimento o ódio e que levam esses humildes Moçambicanos de Palma e de Pemba a verem refugiados, mortos de todas as formas e a confirmarem que há sangue no capim. Há empresas estrangeiras que laboram em todo o território de Moçambique. E em Cabo Delgado, civis brancos e negros exploram o solo, criam riqueza, trabalho e progresso – Moçambique merece tudo isso e merece sobretudo a paz. Há muita pobreza nesse país e calcula-se que a pobreza atinge 60% da sua população, bem como se estima que há um analfabetismo de 55%. Ora os políticos que lideram os destinos e o bem-comum de Moçambique, tiveram já mais de 50 anos para fazerem melhor pelo seu povo. Mas não. Têm-se limitado a roçar as calças e os casacos adquiridos em Paris ou Londres e a engordarem-se em todos os aspectos. Moçambique – para os seus políticos – é Maputo, a Beira e, no máximo, Nampula. Todo o resto é capim, é gente sem nome, é gente que vive entre animais selvagens. Vai com cerca de quatro anos que a guerra jihadista actua contra as populações nesse Nordeste moçambicano, fazendo massacres, crimes autênticos de guerra e o seu presidente Filipe Nyusi – não se sabe porquê – parece indiferente ao terror existente. Não se sabe se tem medo de perder soberania ou se apenas lhe interessa a exploração dos solos em Cabo Delgado, indiferenciando-se da vida dos cidadãos. Nyusi não pede ajuda internacional, aceita rebuçados que não comprometam a soberania e contrata mercenários – que são a diarreia dos incompetentes – da Rússia e da África do Sul para recuperarem a paz no seu país. Diz-se que Portugal pode ajudar o povo de Moçambique. Pode, mas o presidente diz que “quem defende Moçambique são os moçambicanos”. Mas onde estão? Que armamento têm? Que formação têm de guerra de guerrilha? Que sentido de Estado têm os líderes moçambicanos para fazerem frente a radicais-loucos que matam o seu povo? Que fez Portugal pela formação política dos seus líderes, antes de lhes darem a independência a toda a pressa, conforme estava determinado no programa do Movimento das Forças Armadas no 25/A/74? A Igreja de Braga, na pessoa do senhor Arcebispo D. Jorge Ortiga, tem estado atenta ao que se passa em Pemba. Inclusivamente a Arquidiocese de Braga tem um protocolo com a Diocese de Pemba em que já há muito tempo tem havido ajuda e colaboração económica, serviços vários, cultura, etc. Mas Braga, a Arquidiocese, apenas e só pode colaborar no que tem colaborado. As ajudas a Moçambique, a reconquista da paz para o povo moçambicano tem de nascer pela via internacional. Comentaristas aventam que o problema de Cabo Delgado pode-se tornar num rastilho para um conflito internacional. Pode, com certeza. Mas onde tem estado o Governo de António Costa perante o conflito denunciado que se tem vivido durante estes três anos e meio? Que recados tem levado este Governo à União Europeia para se travar as mulheres violadas, raptadas, jovens moçambicanos a serem obrigados a combater e a fugir, vandalizando-se tudo perante ameaças constantes? Que eco têm feitos os grandes órgãos da Comunicação Social do nosso país para alertar o mundo do que se passa em Moçambique? Esta comunicação social e este Governo português – ao lado do presidente moçambicano, Filipe Nyusi – parecem fazer o que Pilatos fez na condenação à morte de Cristo: houve sangue – neste caso, há sangue no capim. (O autor não segue o novo Acordo Ortográfico)
Autor: Artur Soares
DM

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2 abril 2021