A guerra de guerrilha que enfrentámos em África, de sua natureza insidiosa, inopinável e traiçoeira, exige na sua organização, manutenção e êxito um conjunto de princípios básicos como sejam:
1.º – Inteligência – manifesta-se no cumprimento rigoroso de certa regras que visam essencialmente a destruição e dispêndio do máximo de energias e meios de combate do adversário; e, assim, deve-se mudar constantemente os métodos e locais de atuação e evitar o combate direto, após a execução de uma ação violenta e rápida; e sempre que possível simular a intenção de ataque num ponto, fazendo convergir para aí toda a força e atenção do adversário, mas atacar realmente no ponto menos protegido e mais negligenciado pelo adversário; e esperar, depois, e sempre a melhor oportunidade de atacar, após ter conduzido o inimigo à negligência e fazendo crer na fraqueza de seus meios de ação.
2-º – Iniciativa – A guerrilha só pode ser coroada de êxito após o conhecimento profundo e válido sobre os pontos fracos e meios do adversário e de aturada e sólida instrução e adaptação ao terreno; e carateriza-se pela procura e incitamento do adversário à luta, quando este a ela se pretende furtar ou lhe interessa mais retardá-la.
3.º – Espírito ofensivo – A maior virtude do guerrilheiro é a vontade de lutar e, sem este espírito ofensivo, a iniciativa falha; e apoiado nas intenções do adversário, o espírito ofensivo carateriza-se, na prática, pelo avanço ou recuo calculados, quando o adversário recua ou avança e pela flagelação ou ataque quando ele estaciona ou se mostra fatigado.
4.º – Segredo – Muitas ações que mobilizam grande número de homens e de meios, cujo planeamento custa horas de labor e se crê na sua eficácia falham na hora exata por quebra de segredo e, consequentemente, de surpresa; porque a máxima de que o segredo é a alma do negócio nunca ,foi tão verdadeira e válida como numa guerra de guerrilha e contraguerrilha e leva a que o combatente saiba dominar-se e à sua língua para não falhar na ação que pretende realizar.
5.º – Rapidez na execução – Estabelecido o contacto com o inimigo, a atuação deve ser rápida e violenta, impedindo, assim, que o adversário se recomponha e organize para contra-atacar, passados os momentos de surpresa e choque; e, deste modo, uma verdadeira ação de contacto próximo não deve ir além de quatro, cinco minutos de duração, a fim de evitar a possibilidade de reorganização e reação do adversário.
6.º – Assalto e extermínio – Uma ação de guerrilha visa sempre a liquidação do maior número possível de adversários e de meios e a apreensão de material de guerra (armas, munições, víveres e, até, fardamento), importando mais abater ou capturar elementos combatentes do que pôr em debandada o grupo de combate; porque o abate de homens, a sua captura ou a apreensão de material aumenta sempre a confiança e denodo moral do guerrilheiro para futuras ações e a confiança da população que o apoia.
7.º – Apoio da população – Para captar e garantir o apoio da população sem o qual a guerra de guerrilha não terá significado nem futuro, o guerrilheiro deve proceder sempre com espírito de solidariedade, disciplina e verdade para com ela, defendendo-a e aos seus bens e insuflando-lhe sempre ódio contra o adversário; e este apoio que se traduz em fornecimento de meios logísticos, ocultação e informações sobre a posição e localização do inimigo, planeamento de ações que pretende executar e deslocamentos no terreno que está para efetuar (para onde e a que horas), é fundamental para a organização e atuação com sucesso da guerra de guerrilha.
São estes, no fundo, – os princípios orientadores de uma guerra de guerrilha que devem ser cumpridos com rigor quando dela se pretende retirar algum sucesso. Em Angola, a nossa atuação de contraguerrilha sempre nos obrigou, apesar da organização deficiente e capacidade de ação bastante imperfeita dos Movimentos de Libertação, a permanente vigilância, deslocação no terreno e intensa capacidade de combate, pois o guerrilheiro é perito em saber tirar partido e retirar o máximo rendimento dos nossos cansaços, acomodações, facilidades e distrações; e, assim, deixa-nos passar, deambular, estacionar hoje, amanhã, um mês, dois meses sem se manifestar e mostrar, e somente quando vê que tem possibilidades de êxito, é que mostra a sua força, violência e poder de destruição; porque a incógnita, a perfídia, o imprevisto e a tenacidade, tal como os dos cavalos de Tróia ou dos beduínos do deserto, são a divisa da guerra de guerrilha que tivemos de combater.
Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado