Todos nós temos a noção e compreendemos a riqueza dos aspetos formativos e educativos da prática desportiva, mas genericamente temos pouca sensibilidade para a importância e significado da função do árbitro. Um árbitro é alguém que não está só para agir disciplinarmente, mas essencialmente para ser, também ele, um agente educativo.
Para o bom funcionamento social, é extremamente importante o respeito pela autoridade. E este aspeto é fundamental no processo desportivo, ou seja, respeitar a autoridade dos treinadores, dos dirigentes e dos árbitros, é elementar para estabelecer e inculcar valores sociais que são essenciais. Desrespeito gera desrespeito. Por exemplo, quantos clubes têm a preocupação de realizar, no processo de formação dos seus quadros (dirigentes, treinadores, atletas e até os pais), uma adequada abordagem às regras?
A vitória não representa tudo, nem é a única coisa que interessa, e desta forma, não vale tudo para ganhar. Vários estudos comprovaram que, quanto mais baixo é o nível tático/técnico dos praticantes (e não estamos a falar em idade), maior é a probabilidade dessas equipas/jogadores utilizarem o desrespeito pelas regras, por tentar ludibriar os árbitros e, inclusivamente, de usar meios ilícitos (doping ou mesmo violência). Ou seja, tal como nos últimos tempos tem acontecido no futebol, os árbitros carregam uma carga negativa, de frustração, de “saco de boxe” de muitos dirigentes, treinadores e, por arrasto, de atletas, mesmo que em mais de 97% dos casos apitem de forma assertiva.
É evidente, que os programas televisivos de debate futebolístico não ajudam, a atitude dos dirigentes nas conferências de imprensa não ajuda, a linguagem dos espectadores nos jogos não ajuda, a banalização da crítica às arbitragens não ajuda, a fraca atuação dos jogadores, tantas vezes, não ajuda e a associação da derrota à atuação dos árbitros também não ajuda, mas a noção da importância da função do árbitro tem que ser diferente.
O problema não está muitas vezes “neles”, inclusivamente, “eles” são muitas vezes melhores que o próprio jogo e o nível de desempenho dos jogadores. As medidas de proteção, avulsas, não são grandemente eficazes. As medidas de emergência apenas fazem emergir a urgência da resposta, pouco mais. A raiz da mudança estará na educação, na formação e na inovação. Processos de inovação assentes em pessoas e nas tecnologias, em novas fórmulas de resposta a problemas antigos, que advém da falta de cultura desportiva. Mas essencialmente com a mudança de atitude na liderança (“Quando um líder não respeita todos ficamos a perder”, afirmou, sabiamente, a atriz Meryl Streep).
Sou daqueles que acredita que as grandes mudanças se fazem em pequenos contextos. Acredito no efeito “borboleta” e, acredito, na reprodução de boas práticas como factor de desenvolvimento e promoção de mudança.
Autor: Carlos Dias