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Fim de uma certa oligarquia?

= Agora que se fechou em definitivo o ciclo de vida – suficientemente longa – de tão vetusta personagem, ainda vamos sentindo as réplicas do realizado… umas vezes bem, outras sem brilho e pouca glória; tantas de combate e muitas de contestação; umas com direito à indignação, outras a roçar a indignidade (processo de descolonização); muitas vividas com vitórias e quantas outras sorvidas com tragos de derrota; bastantes com popularidade e não menos no equilibrismo em serem consideradas dalgum populismo… à luz dos factos hodiernos; visto como herói em momentos de crise, embora podendo ser interpretado como renegado por outros mais fundamentalistas; pretenso conciliador, embora com posições de inveterado inconformista…

= Quando esboçamos estas apreciações – que não são, de forma alguma, juízos nem nada que possa ser julgado como tal, pois só Deus (creia-se ou não n’Ele) nos pode avaliar… – decorrem os vários itens das (ditas) cerimónias com o designado ‘funeral com honras de Estado’ – algo único em mais de 40 anos de democracia – e que, na intenção dos promotores, devia ter contado um pouco mais com uma manifestação popular de massas – ou esperavam antes que fosse, mais uma vez, populista? – de reconhecimento nas ruas dos feitos do ‘rei da república’ e sua família! Dá a impressão que o funeral, sobretudo, se tornou partidário em excesso… Onde estavam os jovens? Porque não se viram adolescentes e crianças?

= Tenho mais de cinquenta anos e recordo-me desta figura pública nas lides da política… pura e dura. Não sou, por isso, dos que não viveram – com que aflição apreensiva – tantos dos atos e factos dos tempos mais recuados ou nas posições mais recentes e de razoáveis agruras… Não sinto, no entanto, que tudo foi louvável e que nada (ou muito pouco) deixou de ter marcas na nossa identidade coletiva – sem ser coletivista – desde a dimensão económico-financeira até às consequências de decisões ideológicas… mais ou menos visíveis e/ou toleradas… na Europa e para com o resto do mundo!

= Não sou daqueles – mesmo que de forma indireta – são ingratos. Muito daquilo que hoje podemos ser – com liberdade, tanto social, como cultural e até religiosa – está enraizado na longa e fundamental história de quem soube defender a diferença, mesmo com prejuízo mais ou menos tolerado do seu sucesso... Talvez a influência de quem acompanhou o agora aureolado de ‘heroicidade’ tenha tido importância, mesmo que não o possa ter sido assumido tão claramente, como seria desejável. Umas tantas raízes de teor espiritualizante foram fazendo caminho, atendendo aos ancestrais e com ramificações que devem ser pontualizadas muito para além dos mentores do triângulo…supremo.  

= E o futuro, o que é que nos trará sobre a (dita) defunta oligarquia? Quais serão os efeitos do final do reinado sobre as mentes e no trato com os ‘súbditos’ um tanto confusos e em recuo de visibilidade?
Agora que estamos numa espécie de novo paradigma ainda poderemos esperar que algo vai ressurgir na mentalidade dos vindouros? Será que estamos a viver o estertor de algo que está caduco e ultrapassado? Como poderemos aferir com confiança que os novos tempos serão mais norteados pelo direito do que pelo protesto à indignação?

Atendendo à simbólica das flores vistas no funeral – rosas e cravos – e às cores – brancos, amarelos e vermelhos – poderemos tentar ver muito mais do que o que foi mostrado… Embora respeitando as opções religioso-culturais, ousamos dizer: ‘Resquiescat In Pace’ (descansa em paz), Mário Soares!


Autor: A. Sílvio Couto
DM

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16 janeiro 2017