Fátima é hoje o Altar do Mundo, aonde convergem peregrinos de todas as partes do globo, mas o mundo já foi o altar dos portugueses que partiram à sua descoberta, imbuídos de muita fé, enfrentando grandes sacrifícios, no meio da bravura dos oceanos “por mares nunca dantes navegados”, conscientes da fragilidade das embarcações e da reduzida fiabilidade dos seus instrumentos náuticos. Mesmo assim, partiam com coragem, mesmo sabendo que, muitos deles, iriam perder a vida. Levavam consigo uma grande fé assente num ideal cristão tão alicerçado neste nosso espaço lusitano, procurando levar para toda a parte o retrato fiel da Pátria: a fé em Deus e a devoção a Santa Maria, construindo templos e deixando outras marcas dos seus tão vincados valores cristãos.
Logo na tomada de Ceuta, no dia 21 de agosto de 1415, a maior mesquita muçulmana foi dedicada à Padroeira Nossa Senhora da Assunção. Nela, no domingo seguinte, no momento da sua consagração ao culto católico, D. João I armou seus filhos, D. Duarte, D. Pedro e D. Henrique, cavaleiros. Além disso, nesta mesma cidade, foi fundada a primeira paróquia portuguesa, além-fronteiras, tendo como sede uma Igreja dedicada a Santa Maria de África.
A Rainha D. Leonor e os irmãos do rei D. Duarte, encorajados pela conquista de Ceuta, aconselharam o rei a conquistar outras terras no norte de África, encarregando D. Henrique do comando dessa expedição. D. Fernando (não confundir com rei D. Fernando, O Formoso, que reinou entre 1367 a 1383), o Infante Santo, em agosto de 1437, lá partiu com o seu irmão D. Henrique com o objetivo de conquistar Tânger, mas antes, não ficou esquecida a devoção a Nossa Senhora, comungando na Ermida de Santa Maria da Escada, participando na procissão do dia 14 e, ainda, solenizando, na Corte, a festa da Senhora da Assunção, partindo no dia 22 de agosto. Em Ceuta os dois Infantes foram pedir a proteção de Santa Maria de África, mas o desastre de Alcácer-Quibir foi uma realidade, ficando D. Fernando preso como garantia da entrega de Ceuta, mas as Cortes reunidas em Leiria não aceitaram e D. Fernando morreu em Fez, mártir da Pátria. Nossa Senhora, a vários séculos das aparições de Fátima, como que a mostrar a Sua gratidão pela fé dos portugueses, sempre deu sinal de carinho e de presença, como se diz, segundo a obra abaixo referida, no episódio passado no último dia de Cativeiro de D. Fernando: «viu ele projectar-se na parede do cárcere, em Fez, uma Senhora assentada em um alto estrado, cercada de muitas gentes mui formosas. D. Fernando disse ao seu confessor que seria a Virgem Maria Madre de Deus. Era ela que … vinha dizer-lhe que não tardaria a entrar no Céu.» O que aconteceu, logo ao anoitecer, no dia 5 de julho de 1443, D. Fernando deixava o martírio para gozar das bênçãos de Deus.
D. Henrique, o grande aventureiro dos descobrimentos, pediu a intercessão da Virgem Santíssima e dos Reis Magos para que lhe mostrassem novas estrelas que o guiassem na descoberta de novos mundos e de novas gentes. Faleceu, em Sagres, no ano de1460, sendo um dos maiores vultos da história dos descobrimentos. Tantos outros se seguiram como foi o caso de Vasco da Gama, encarregado por D. Manuel I para comandar a expedição no sentido da descoberta do Caminho Marítimo para a Índia, que pediu a intercessão de Maria, como luz e guia nas agruras dos oceanos. Em 1939 foi colocado em Nazaré um padrão comemorativo como prova da ida do navegador, antes de embarcar para a Índia, como peregrino, à Senhora de Nazaré, pedindo a sua intercessão, trocando a valiosa corrente de ouro que possuía pelo “colar de contas da Virgem”, referindo a lenda que à passagem do Cabo das Tormentas, além de todos os perigos relatados na transposição deste local, levantou-se uma grande tempestade que acalmou após o Almirante lançar às águas o colar da Senhora de Nazaré. Logo que chegou a Portugal, em setembro de 1499, com metade dos marinheiros e sem o seu irmão, Paulo da Gama, Vasco da Gama, além de se ajoelhar aos pés de “Nossa Senhora de Belém, Senhora do Restelo, Senhora da praia das lágrimas…” foi, como romeiro, agradecer à Virgem as graças concedidas, doando à Senhora de Nazaré um valioso manto, além, com certeza, de cumprir outras promessas.
Outros vultos da história dos descobrimentos seguiram as passadas dos seus antecessores, como foi o caso de Pedro Álvares Cabral e dos seus marinheiros que, no dia 9 de março do ano de 1500, se fizeram ao mar rumo à Índia, levando a imagem de Nossa Senhora da Esperança e, numa deslocação mais para ocidente, avistaram, na última semana de abril, a terra de Vera Cruz, lançando nela, em seguida, as sementes cristãs, celebrando missas, sendo “num beijo a Cristo que a gente da Terra de Vera Cruz se encontrava, pela primeira vez, com a gente da Terra de Santa Maria.”
Principal fonte destas crónicas: “Fátima Altar do Mundo”, 3 volumes, sob a direção literária do Dr. João Ameal da Academia Portuguesa da História; direção artística de Luís Reis Santos, historiador de arte e diretor do Museu Machado de Castro, Coimbra; realização e propriedade de Augusto Dias Arnaut e Gabriel Ferreira Marques, editada pela Ocidental Editora, Porto, em 1953.
Autor: Salvador de Sousa
Fátima, sempre foi, já é e será sempre mais (7)

DM
19 novembro 2017