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Farsantes da vida

Farsante diz-se de quem representa farsas, impostor, intrujão, pantomineiro.

Todos os dias lidamos com a farsa de alguém, grande parte das vezes inócua, mas muitos já deixaram de lado uma farsa aqui ou de acolá, de hoje ou amanhã, para a acompanharem de vez, para se transmutarem na mesma, para se confundirem com ela. Se o “diabo veste Prada”, o farsante veste tudo se supostamente lhe dizem ser bem. Digamos antes veste caro. Se aliar um carro que dê no olho (importa pouco se comprado em várias mãos, mesmo que a prestações suadas ou dado num qualquer negócio escuso) o que interessa é parecer. É preciso é passar a nota de sucesso e, se de generoso ou benemérito, (com o dinheiro dos outros ou de trapaças) tanto melhor.

Sustentam toda uma vida em barris de pólvora que podem explodir a qualquer momento, basta a faísca certa. Ainda assim, curvam-se e condoem-se como se de vítimas se tratassem enredando os mais incautos em renovadas farsas. Mas deitam-se bem, não têm memória, que importa a faísca se sentem a impunidade e julgam que o poder de algum dinheiro e uns almoços grátis é o bastante.

Uns há que têm profissões de estatuto, outros não têm, mas tudo fazem para parecer ter. Tudo pouco interessa, importa sim as reverências, os olhares, as fotografias que revelam, embora o discurso é que não gostam daquelas, de salamaleques, nem de se exporem. Mas, ai se outros os ultrapassam na exposição ou graças que, supostamente, não pretendiam! Atiçam-se como cães raivosos. Passeiam-se na vaidade, falinhas mansas, acham-se cultos porque decoram meia dúzia de citações, provérbios e frases recitadas amiúde, questionando os outros e enchendo o balão da prosápia quando os outros não respondem, ou não querem entrar nesse concurso e não lhes retorquem por educação com tanto outro saber que aquele, certamente, ignora.

A toda hora o farsante se vangloria, procura mostrar tudo o que faz ou pretensamente faz, diz tudo e todos conhecer, quem para ele são – sem o serem – amigos (os por qualquer razão tidos importantes), engrandece currículos, é económico na verdade.

Alguns agem criminosamente até, outros limitam-se a ser uma nódoa moral, um espinho cravado nos valores fundamentais da dignidade e do respeito pelo outro.

A vida dos farsantes é o dinheiro como medida de todas as coisas e a mentira, esta como sua essência, que dela não saem. Se aquela lhe traz benefícios, tudo fará para a passar como verdade. Já esta, se castigadora ou cruel, torna-a em mentira.

Mas têm um grande atributo: deitam-se e conseguem dormir, pois vergonha ou remorsos não lhes assomam. Notável sem dúvida.

Colam-se aos poderes, rodeiam-se de bufos, proliferam nos esquemas, forjam casualidades e factos.

Até que podem explodir. Quando não sabemos, mas explodirão mais não seja para quem crê numa justiça para além dos Homens!

O Farsante tem todo um manancial adquirido de palavras doces, toda uma panóplia de artifícios. Em boa verdade, são os novos vendilhões do templo e, de facto, muitos até se aproximam dos templos por razões além da fé, de interesses e objectivos próprios e negros.

Há vários tipos, géneros, naturezas. Será difícil retratar todos. Porque então não os revelámos ou não caem facilmente?

Porque, para além daqueles serem doutorados na dissimulação, também hoje estamos num mundo de pressas, cheio de encantos e miríades superficiais, na busca do material, do efémero que nos escapa da alma onde não se vê além da neblina. E eles andam por aí!


Autor: António Lima Martins
DM

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8 fevereiro 2023