Estamos a viver momentos bastante duros no nosso país. Uma boa parte dos partidos que tem representantes na Assembleia da República são partidários da eutanásia.
Se isto é triste, muito mais feio é o procedimento seguido em relação ao eleitorado. Nos seus programas não aparecia esta iniciativa. Calaram-na muito bem calada, demonstrando, deste modo, que o poder que o povo lhes dá pode ser manipulado como os seus dirigentes entendem para alcançar objectivos inconfessáveis.
Num programa com que um grupo se apresenta a votos, certamente que devem constar as principais directrizes do comportamento ético-político dos deputados e do sentido das suas votações na Assembleia da República. Ocultá-las pode significar várias coisas: ou não ter uma noção objectiva da importância e do significado de algumas opções fundamentais que tomam, o que significa falta de cultura e de orientação; ou calar determinadas iniciativas com receio de que possa baixar o número de votos no seu partido. Mas depois, uma vez alcançado o poder, e com a garantia de um triunfo mais ou menos evidente, colocá-las como se fosse uma iniciativa lógica e irrepreensível. Isto chama-se oportunismo político.
Dos partidos que compõem o nosso Parlamento, infelizmente, de uma maneira clara e objectiva, aqueles que promoveram, post-eleições, a linha da aprovação da eutanásia, agiram, ao que é de supor, do segundo modo, manifestando um desprezo olímpico pelas opções fundamentais dos eleitores. Não os puseram diante duma questão fundamental do ser humano. É possível que o poder público aprove que um cidadão peça para lhe retirar a vida, porque está cansado e farto de existir, ou porque não vê perspectivas de melhorar a sua condição? A vida humana é inviolável ou não?
Dão por suposto que o voto que o cidadão lhes concedeu permite decidir tudo aquilo que os seus dirigentes entendem. É a ditadura do voto conseguido. Não têm limites nem barreiras; e os seus mentores não se sentem obrigados a pôr questões fundamentais a quem neles votou. A temática da inviolabilidade da vida humana não pode ser posta em causa ou tratada como assunto supérfluo por um eleitorado que ignorava essa iniciativa do partido que mereceu a sua preferência. Ultrapassa, em muito – em tudo – o que honestidade de um cidadão responsável pressupõe e exige quando vota. Vê-se de surpresa nas garras de quem se sente absolutamente livre para deliberar sobre o que quer que seja, desde que receba um número de votos satisfatório.
Um pequeno partido – Iniciativa Liberal – , teve a coragem de manifestar no programa que preparou as suas ideias sobre a eutanásia. Lamento profundamente que a defenda, mas, pelo menos, tratou os seus possíveis votantes com delicadeza, ao informá-los sobre este assunto tão capital, dizendo o que pensa e que iniciativas iria tomar. Suponho que, talvez por isso, houve eleitores que fizeram outras opções. Mas, pelo menos, os seus mentores manifestaram seriedade, não enganando ninguém.
O “politicamente correcto” tem as suas limitações. Não é uma atitude errónea e sórdida que dê por suposto que pode pôr de lado o que um cidadão deve saber, na integralidade das propostas que se lhe oferecem, para poder votar em consciência num agrupamento político. E é isto o que os partidos proponentes da eutanásia fizeram, salvo o caso que se referiu há pouco: de repente, como que caída do céu, sem qualquer satisfação para com o eleitorado, propõem o que sorrateiramente ocultaram. E manifestaram uma pressa nervosa em aprovar o que tanto desejam, como se viu.
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva