Leccionamos e somos investigadores nas áreas de Direito e processo penal, trabalhámos directamente com o actual presidente do Tribunal Constitucional Sr. Prof. Cat. Doutor Manuel da Costa Andrade, quando estivemos a reger a unidade curricular de Criminologia na Licenciatura de Direito durante 4 anos na Universidade Portucalense.
A Política Criminal faz parte do nosso dia-a-dia de pesquisa. Já neste jornal, em 18/9/14, p. 22, alertámos para os então problemas de ausência duma lei-quadro actualizada de política criminal, entretanto “lacuna ultrapassada” com a Lei n.º 72/2015, de 20/7, biénio 2016/2017. Lacuna que, contudo, antes da entrada em vigor desta última legislação, persistiu na praxis durante alguns anos. O que, só por si, revelava um grave problema de organização nacional no Ordenamento Jurídico Interno, nomeadamente na área das ciências jurídico-criminais.
Desta nossa profícua experiência, cedo concluímos que não tem sentido nenhum estar a formar gestores e economistas que não compreendem as questões da prevenção da criminalidade económica, social e financeira. Numa altura em que as fraudes internacionais financeiras, e as fugas aos impostos ilícitas, bem como as lavagens de dinheiro associadas e toda a criminalidade organizada inerente, incluindo contabilidades paralelas, atingem dimensões incomensuráveis de milhares de milhões de €/$, torna-se cada vez mais importante formar os gestores e os economistas, entre outras profissões e áreas, de modo a que a prevenção da criminalidade em geral, e da corrupção em particular, passem a ser naturais. Como já afirmava Muhammad Yunus, Prémio Nobel da Paz 2006, “inventores do microcrédito”, a pobreza é o maior inimigo da Paz.
Ora, a corrupção e a criminalidade, em termos de Justiça universal, são geradoras de pobreza. Não obstante não basta seguir o caminho da aprendizagem da “gestão do risco da fraude” p.e. empresarial. Nos começos de 2010, faz agora cerca de 7 anos, propusemos por escrito à ESG/IPCA uma pós-graduação que tivesse por objecto, não só, mas também, a Lei n.º 25/2008, de 5/6, com alterações até à Lei n.º 118/2015, de 31/8.
Essa ideia faz parte da nossa pesquisa de Doutoramento desde 2003. Chamamos de GIRO-Gestão do Ilícito e sua Remissão às Organizações. Mas como se podia verificar no programa, o objectivo desta formação não era só responder às exigências do Dever de Formação, previsto no art. 22.º da Lei n.º 25/2008. Era também – como consideramos ser indispensável –, dar formação no âmbito do Direito e processo penal, criminologia e política criminal. I.e., não basta a “Gestão do Risco da Fraude” do ponto de vista económico ou contabilístico ou fiscalista ou de gestão.
Repare-se que não é por caso que o núcleo fundamental dos Direitos, Liberdades e Garantias constitucionais é o centro da chamada Constituição Criminal lusa. Como é que alguém, como p.e. um gestor que não sabe aplicar o que é uma acção (ou omissão) típica, ilícita, culposa e punível, a autoria e comparticipação, o dolo ou negligência, os princípios fundamentais como o da culpa, ou legalidade, ou do acusatório, etc., pode prevenir e perceber a criminalidade, e portanto a corrupção, em toda a sua plenitude?! É óbvio que é impossível.
Daí um curso de pós-graduação nesta área ou de licenciatura, entre outras vertentes, ter que ter a participação obrigatória de criminalistas, de penalistas. De contrário, a formação apresentará graves lacunas jurídico-científicas e provocará novos ilícitos e fraudes.
Autor: Gonçalo S. de Mello Bandeira