Tinha um estatuto diferente que fazia dele um parceiro especial. A partir daqui podia-se adivinhar que mais tempo menos tempo, este menino rico diria adeus aos seus parceiros de viagem; deseja viver sozinho porque tem posses para isso. E foi o que aconteceu. O Reino Unido anunciou a despedida e disse aos restantes: vivam uns com os outros que eu não quero estar mais convosco. Estes, depois da atordoada, fizeram contas e teceram teorias sobre as consequências desta saída.
Penso que ninguém sabe ao certo o que vai acontecer quanto a aspetos de cidadania, quer quanto a aspetos económico financeiros. Acho que é um melão por abrir. Esperemos. A percentagem dos que votaram pela saída do UK não foi assim tão convincente; mas ganharam e nada há agora a fazer. O que me parece é que esta saída determinou entre os restantes membros da UE um sentimento de união; mas, será pessimismo meu, este sentimento parece-me mais levado pela emoção/raiva do momento do que por convicção; esta união é mais filha dum estado de irritação e desforço contra o UK, do que cimentada numa vontade intrínseca duma união de facto.
Este sentimento ditado pela pressa mais parece uma desforra. Temo que passado o azedume, o sentimento de união se torne dia a dia mais débil, e rebente em outras saídas, em abandonos sucessivos. Assim penso porque o cimento da união, que é o da solidariedade entre os países, continua colado a cuspo. Os países ricos não querem solidariedade; querem retorno de capitais investidos; querem emprestar a juros e não dar a fundo perdido; querem lucros rápidos e não a longo prazo; querem desenvolver os subdesenvolvidos para eles ganharem poder de compra para os seus produtos.
Estas perspetivas mercantilistas relegam, ou secundarizam fortemente, a doutrina da ajuda solidária. Lembremo-nos que o mercantilismo de Cromwell (séc. XVII) ministro de Henrique VIII de Inglaterra proibiu o transporte marítimo de produtos para a Inglaterra por barcos e comerciantes que não fossem ingleses. Não nos esqueçamos que a rainha de Inglaterra, Isabel I, promoveu, por interesse de sua coroa, Francis Drake de pirata a vice-almirante, lembrando-lhe que era preciso explorar novas terras e trazer dinheiro para Inglaterra.
Lembremo-nos que sempre que o interesse comercial inglês esteve em causa, eles sempre souberam pô-lo à frente de velhas alianças; foi assim que se passou com Portugal por causa do célebre mapa cor-de-rosa: apoderaram-se dos terrenos entre Angola e Moçambique que, segundo acordo e aceitação internacional, ficariam sob administração portuguesa. Nada disto valeu porque a Inglaterra, que pretendia construir por ali uma via férrea comercial, enviou a Portugal um Ultimato que dizia: “ou esquecem o mapa ou terão guerra”. Portugal monárquico capitulou perante a “sua velha aliada” e assim perdemos a administração das terras do mapa cor-de-rosa.
A Inglaterra ajudou-nos nas invasões francesas porque o bloqueio continental decretado por Napoleão, negava-lhe o comércio com a Europa. A história antiga e a recente dizem que quando os interesses comerciais ingleses são beliscados, a Inglaterra fica cega. Isto são factos e não literatura de efeito. São assim os ingleses, está-lhes no sangue como o lacrau. Por isso só espanta a saída do UK da União Europeia a quem não lhes conhece o feitio.
Autor: Paulo Fafe