Não, não tem a ver com alternância, com o sistema democrático que permite que o povo escolha entre uma governação mais conservadora ou outra mais progressista. Assemelha-se mais a uma marcha militar que ora progride, ora para, apesar de poder parecer que o movimento é constante. No entanto, o que quero traduzir nesta peça de crónica é o facto do povo andar a trabalhar, a marchar há tanto tempo, mas sem futuro. Não vislumbra o amanhã, teme pelo futuro dos filhos, cada vez mais incerto e até temível. Os dirigentes prometem-no risonho, mas falham descaradamente as promessas, atentos os interesses pessoais e partidários. Os representantes já não ligam a quem os elege, apesar de dizerem que estão ao serviço do povo. Os tempos da responsabilidade para com os eleitos já lá vai e diminui à medida que os aniversários da democracia se acumulam na história. É a percepção que tenho, o sentir de muitos que ouço dizer que os governos se sucedem sem que se dê aos que votam aquilo que estes precisam e que por tal escolhem uns e não outros para os defenderem na designada Casa da Democracia. O povo não tem saído da cepa torta, apesar dos propalados apoios sociais que dão votos, mas não se traduzem em desenvolvimento.
Todo este introito para dizer que foi um erro – mais um – que se dissolvesse o Parlamento sem que se tenha esgotado o prazo da legislatura. O mesmo que deitar fora um fato comprado há pouco tempo, em relativo bom estado, na moda e que fica bem a quem o veste. Para quê trocá-lo por outro, com o mesmo padrão, de corte idêntico e ainda com a mesma cor, apesar de alguma nuance sem importância de relevo? Apenas por vaidade, alguma arrogância e desprezo por quem não tem nada e vive de esmolas e da solidariedade nos bairros pobres da cidade! Estava descosida uma costura? Que seja consertada!
Não me parece coisa suficiente para desmanchar um programa o facto de um Orçamento de Estado não merecer a concordância da maioria. Pode ser que ele tenha sido forjado para não ser aprovado logo que se apresenta, mesmo com emendas e remendos, apesar destes poderem até dar consistência à obra inicial. Por que não se exige um novo documento, melhor preparado de raiz e com argumentos bastantes para agradar a mais apreciadores? A feira e as lojas de indumentária mais recente não têm fazenda muito diferente da usada em cerimónias anteriores. O fato novo não será muito diferente e a fotografia que sair da reunião de grupo vai parecer as que saíram em casamentos anteriores. Mudarão algumas posições dos convidados, mas o colorido será basicamente o mesmo. A tendência não mudará substancialmente, nem mesmo para justificar o adiamento de projectos por causa da antecipação da reunião.
Pode ser que a nova versão de grupo contenha uma arrumação diferente, mas o colorido não será muito mais brilhante. O máximo que pode acontecer é a formalidade jurídica de alguns dos convidados que antes se apresentaram solteiros – eram apenas namorados, vivendo cada um em sua casa – e agora na nova reunião se apresentarão juntos de facto, com direito a decidir por conta do novo estatuto. Por exemplo, a Catarina e o Jerónimo, de traje avermelhado, aparecerão com áurea diferente e diminuirão os que antes se posicionavam mais na ala dos que trajavam de rosa. Mas, tudo isso não interessa muito ao povo que vê os representantes na foto. Quando muito, podem ter alguma curiosidade os que têm lá alguma costela amiga, um líder que admiram, mas serão certamente muito poucos.
De casamento já chega por hoje, de reuniões e fotos de família também. Vou dizer mais algumas palavras sobre a política que corre, da que alguns a querem lenta, mesmo vagarosa, para que cheguem a tempo do banquete. Bem, alguns também bulham até com correligionários, arranhando-os, para que sejam arredados da festa, para assim terem lugar. Ao contrário do que dizem outros, a maioria dos portugueses acha que o que está a acontecer era evitável e que a dissolução da Assembleia da República não era o caminho óbvio depois do Orçamento não ter sido aprovado. Mas, quem manda pode. A democracia também permite estas vontades!
Autor: Luís Martins