O momento era único, implacável para uma das equipas, pelas circunstâncias, tudo se conjugava para um momento de festa, repleto de orgulho. Jogar em casa, com o estádio apinhado de assistência - como há muito tempo não se via, em face desta maldita pandemia - proporcionava-nos alguma vantagem. Finalmente em festa dentro de um espetáculo desportivo. O momento também era de gala, porque todos os máximos responsáveis políticos se dispunham na primeira linha, de forma a serem vistos. O alinhamento inicial das equipas fez criar as dúvidas aos especialistas da bola, e a pergunta mais ouvida era: “O que é que se pretende com esta equipa?”. Mesmo assim, ainda se ouvia: “Temos muito talento em campo. Temos dos melhores jogadores do mundo. Temos atualmente uma das gerações mais brilhantes de sempre.” Quando se iniciou o jogo, até parecia que os astros se alinhavam com as nossas estrelas, para uma noite de glória.
Com o decorrer do jogo, a ilusão deu lugar à consternação, a festa atenuou e as unhas passaram a ocupar a boca, que até ali se esfalfava em gritar, orgulhosamente: “Portugal! Portugal!” Toda a dinâmica tática da equipa se baseou apenas no mérito e iniciativas individuais, sem chama, sem coletivo, sem domínio daquilo que gostamos de fazer em campo, que é ter a posse e controlo da bola, virados para baliza do adversário. O jogo passou a ser pouco característico, enfadonho, com muito chuto para a frente, com constantes perdas de bola, sem direção.
A atitude dos jogadores quando recebiam a bola era retroceder, passar para os defesas, deixar passar o tempo sem intenção de atacar. Jogo cinzento, sem ambição, sem plano. Depois do golo adversário, decisivo, a poucos minutos do fim, a “velha sina” de sofrer até ao fim do apuramento, com o credo na boca e com penosos cálculos, voltou a acontecer.
Os tons de festa, coloridos, deram lugar a uma tristeza medonha, à desilusão coletiva, à imagem de um dia chuvoso, frio, como de inverno se tratasse. A minha tristeza não surge apenas por perder, mas acima de tudo por perder sem que os melhores se manifestassem, sem que o talento tivesse aparecido, sem que a alma lusa se tivesse imposto, essencialmente por não sentir a competência e a vontade em procurar fazer o “nosso” melhor.
Ainda temos uma hipótese, ainda há o play-off de apuramento. Na verdade, são dois jogos, que nos podem ligar novamente ao Mundial do Qatar e ao percurso constante desde 2000.
Nestes jogos não dá para empatar. Não dá para repetir esta estratégia aplicada na Irlanda e em Lisboa, que nos conduziu a esta situação. Não dá para gerir pontuação. Empatar não serve. Temos que ganhar. Todos sabemos que os selecionáveis portugueses são atletas “influencers” nas suas equipas, mas quando se juntam na seleção parece que as suas ações colidem e alguns egos ficam feridos.
Espero que aprendam com o que aconteceu nos dois últimos jogos e apliquem o seu talento, ao serviço da equipa Portugal.
Autor: Carlos Dias
Em tons de inverno

DM
19 novembro 2021