Amanhã, cada cidadão português está chamado a fazer o que ninguém pode fazer por ele: participar com o seu voto nas eleições legislativas.
Felizmente, o nosso sistema democrático – honra lhe seja feita! – permite a liberdade de escolher, no próximo acto electivo, os candidatos a deputados apresentados pelo partido que mais confiança nos merece. Mas permite-nos, também, uma série de opções no uso da nossa cidadania, que devemos realizar sempre com a consciência de que a nossa opção é a mais adequada.
Nesta ordem de ideias, posso não votar. Mas esta minha atitude só deve ser considerada, quando, em consciência, não estou devidamente informado sobre os candidatos que os partidos apresentam. Não é, assim, uma atitude correcta, se eu não voto, porque “não estou para isso”, ou por motivos claros de comodismo.
Acredito que haja pessoas que não vão votar por não estarem de acordo com o sistema democrático, porque se encontram ocasionalmente em viagem repentina e inevitável, ou porque foram surpreendidos por uma doença recente e imprevista e não podem deslocar-se às devidas secções de voto.
Mas abster-se de participar em eleições não pode nem deve significar desleixo, falta de interesse, ou, pura e simplesmente, um encolher de ombros perante um sistema de vida política onde todo o cidadão deve contribuir com o que pode – o seu voto é fundamental – e é expressamente convidado a fazê-lo. Desentender-se é uma afronta, é uma manifestação de egoísmo e de grosseira falta de educação cívica.
Reparemos que nas urnas, os nossos votos podem significar muitas coisas. Em primeiro lugar, uma vontade de que aqueles que entendemos podem servir melhor o país com a sua contribuição na Assembleia da República o façam. Mas posso votar em branco, posso votar de forma a que o boletim por mim deixado seja considerado voto nulo, enfim, o sistema eleitoral concede-me uma série de possibilidades que eu, como cidadão, devo aproveitar para manifestar a minha atitude.
Insistimos: as desculpas para que alguém não participe de um modo activo nas eleições não devem ser motivadas por um desinteresse total, porque, pura e simplesmente, como se referia acima, não “estou para isso”. Ou como dizia alguém: “Diga-me lá que falta faz o meu voto entre milhares e milhares que são lançados nas urnas?” Ou ainda, segundo recordo, por altura do primeiro referendo sobre a licitude do aborto, deu um cavalheiro – o dia convidava a ir para a praia pelo sol que brilhava no céu, o que ele fez – quando voltava a sua casa e foi interpelado por um jornalista: “Não votei, porque isso é um problema que diz respeito apenas às senhoras...”.
Certamente que se houver uma grande percentagem de não votantes, não podemos deixar de lamentar todos aqueles que o fizeram por razões inconfessáveis, onde o egoísmo e – voltamos a referir “o não estou para isso” –, pesaram de modo inequívoco na ausência de tais eleitores. Mas também quem tem responsabilidade política, por exemplo, um candidato a deputado, deve procurar entender as razões de tanta abstenção e interrogar-se seriamente sobre os porquês desse desinteresse, dessa apatia.
Sobretudo se tanta abstenção não prejudicou a sua vitória eleitoral. Um bom político, creio, se é possuidor de verdadeiro espírito democrático, terá fundamentalmente de sentir pena de que o seu triunfo seja apenas de uma fracção menos volumosa de votantes do que devia ser. E, muito menos, não esfregue as mãos de satisfação, o que seria hipocrisia, e diga: “Ainda bem que não votou tanta gente, porque assim venci as eleições”.
Não pretendo cometer nenhuma injustiça, mas será que a nossa classe política terá dado todos os passos necessários para que a abstenção eleitoral não seja muito significativa? Tem-se preocupado seriamente quando isso acontece?
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva