Depois da transferência do edifício do Convento, Igreja e cerca para a SCMB, ocorrida em 1836, as imagens e capela de Santo António mantiveram-se tal como foram descritas até ao final do terceiro quartel desse século, com uma alteração motivada por uma transacção, outorgada em 29 de Agosto 1861, perante o tabelião António Silvério dos Santos, entre a Mesa da Misericórdia e Gonçalo da Cunha Sottomayor Pacheco e mulher, enquanto senhores da Casa de Belinho, no concelho de Esposende.
Na verdade, por causa de uma questão de falta de pagamento de um foro ou pensão, a SCMB demandou os administradores da dita Casa, pelo Juízo Ordinário de Esposende.
Ora, como a Casa dos demandados tinha uma capela na antiga (e profanada) Igreja da Misericórdia, junto aos Paços do Concelho, e não lhe fora atribuída uma capela equivalente na Igreja do Convento Franciscano cedido à Misericórdia, as partes acabaram por resolver este diferendo acordando, além do mais, que a Santa Casa ficava obrigada a dar à Casa dos demandados, para eles e seus futuros administradores, “uma capela que é a que fica do lado direito da capela-mor, fora desta, e dentro da grade, a qual ficará com a invocação de Sto. António dos Esquecidos, em cuja capela será colocada uma sepultura na forma e pela maneira da posse por que a Casa de Belinho tinha uma capela na antiga Igreja da Misericórdia hoje profanada.”
Mais estipularam que “esta capela achando-se hoje em alguma ruína será reedificada à custa da Santa Casa, e depois de pronta os segundos outorgantes tomarão conta dela e ficam obrigados a repará-la sempre em bom em estado e na forma que lhe foi entregue”, cabendo à Santa Casa o encargo e veneração da mesma capela, “mas só em caso preciso se poderá dela servir e com a particularidade na remoção para ela do Santíssimo Sacramento em dias festivos da Casa”, conforme tudo consta do instrumento público da mencionada transacção, transcrito de fls. 287 a 291, do III volume dos “Apontamentos para a HISTÓRIA DE BARCELOS, de António Miguel da Costa Almeida Ferraz.
Por aqui se vê que a Mesa aproveitou a acção judicial intentada para o recebimento dos foros que lhe eram devidos para resolver uma obrigação em que estava em falta. E quem ficou a ganhar foi o Santo António e os seus devotos que passaram a dispor de um novo lugar de culto, em capela de honra maior, onde em dias de festa se guardava o Santíssimo Sacramento e, por isso mesmo, até então apelidada do Santíssimo Sacramento!
A Misericórdia cumpriu as suas obrigações, designadamente a das obras da Capela de Santo António dos Esquecidos, colocou aí uma sepultura com tampa tumular antiga e um painel do Santo. A Casa de Belinho é que, desde o ano de 1860, deixou de pagar à Misericórdia a pensão a que estava obrigada, levando esta instituição a uma nova demanda que chegou ao Supremo Tribunal de Justiça.
A partir do incêndio que deflagrou em parte da igreja, em meados da década de 70 do século XIX, destruindo muito do seu recheio barroco, os inventários da Misericórdia deixaram de referir a imagem do Santo Antoninho do nicho sobre a porta da Portaria e a Capela da Portaria e respectivas imagens. Mas fosse ou não atingida pelo aludido incêndio, esta Capela foi seguramente demolida antes das obras de construção do asilo de inválidos, na nova ala norte do edifício, entre 1889 e 1890.
De resto, também a ala a sul da igreja, correspondente à antiga casa conventual, foi alterada e reabilitada, em 1909, pela Mesa da Provedoria do Dr. António Almeida Ferraz, o que também implicou mexer na porta da Portaria.
Eis, caros leitores, como os barcelenses deixaram de contar com o Santo Antoninho da Porta, mas puderam passar a venerar o seu Santo António da antiga Capela da Portaria, sob a invocação dos Esquecidos, na bela capela situada no interior da Igreja da Misericórdia, recentemente restaurada, beneficiando da ocasional parceria com o Santíssimo Sacramento!
Autor: António Brochado Pedras
Do Santo António da Porta ao dos Esquecidos (Continuação)

DM
26 junho 2020