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Direito de escolha e realidade

Quando no exercício do seu direito institucional, o povo vota em eleições legislativas não escolhe os ministros, secretários ou subsecretários de Estado e, muito menos, os gestores de instituições e organismos públicos e público-privados; mas, simplesmente, escolhe o primeiro-ministro ao dar a maioria de votos a um determinado partido político; e, até, quando pior é a emenda que o soneto, o primeiro-ministro que escolheu não é o que vai governar, como no caso da formação da geringonça de triste gestação. Depois, é no primeiro-ministro eleito que recai, a partir deste momento, a responsabilidade de escolher os seus colaboradores; e, então, pensa-se, melhor dizendo o povo pensa ao dar-lhe esse poder de escolha, que o vai fazer bem, ou seja, para bem dos governados e, concomitantemente, do país. Só que infelizmente nem sempre assim acontece, e muito menos no caso de um primeiro-ministro não escrutinado; e, seja por pressões partidárias ou de lóbis, seja por ação e influência de ideologias políticas, muitos dos escolhidos são pessoas erradas; como, igualmente, nem sempre o primeiro-ministro escolhido revela ao longo do seu exercício governativo as qualidades e capacidades pretendidas por quem o escolheu. Ora, deseja-se e exige-se que os governantes do país sejam homens e mulheres capazes de se afirmarem pela sua honestidade intelectual, firmeza de carácter e independência de juízo; e, mormente, pela sua isenção, transparência, competência e estadismo que revelem na sua ação governativa; porque só estes governantes podem desempenhar cabal e justamente as funções para que foram escolhidos. Pois bem, ao longo da nossa vivência democrática de quarenta e três anos já, nem sempre a governação do país e a gestão pública e público-privadas se pautou por esta linha de rumo; e, assim, a corrupção, o compadrio, o arranjismo e a incompetência vicejaram como cogumelos nos monturos, conduzindo a economia, o sistema financeiro, os problemas sociais e os princípios éticos ao descalabro. E, quando olhamos à nossa volta com olhos de ver, em determinados cargos e funções do Estado, vemos o pai e o filho, o marido e a esposa, o avô e o neto, o compadre e a comadre... numa autêntica profusão de monarquismo, tachismo e cunhismo; e, depois, esta panóplia de interesses e protecionismos caseiros reflete-se obtusa e profundamente na governação e gestão dos organismos governamentais e públicos com evidentes malefícios para o rigor e transparência económicos e fiscais e obviamente para o bem-estar do povo. Deste nosso acomodado, pacífico e bondoso povo que cansado está de ver à sua volta evasões fiscais, branqueamento de capitais, fugas ao fisco e lavagens de dinheiros e sempre na maior e descarada impunidade; como também desiludido e magoado está com o aproveitamento que os chicos-espertos fazem em proveito próprio e dos compadres de dinheiros e outras mordomias de instituições estatais e, pasme-se, de solidariedade social, mesmo que dedicadas ao apoio e serviço de cidadãos necessitados e diferentes, como no caso recente da Raríssimas. E isto revela total ausência ou negligência do dever de fiscalizar e penalizar por parte de quem legisla e governa; e sobretudo, de quem responsável é pela defesa dos bens do Estado e consequentemente, de todos nós que, deste modo, nos sentimos enganados, usados, abusados e sacaneados na própria dignidade de pessoas e de cidadãos. Agora se Eça de Queirós já no seu tempo qualificava os políticos e a vida política do país como uma choldra, hoje não andamos muito longe dessa triste realidade; e isto sucede quando constatamos a demagogia, a mentira o roubo e a delapidação de bens comuns e numa lógica ignóbil de dolo, malvadez e impunidade de quem os pratica. E , aqui, se põe a questão entre o direito de escolha e a realidade que se vai fazendo do seu uso por parte dos políticos e dos avejões que à volta da política sofregamente voejam, Então até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
DM

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14 março 2018