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Diálogos em agosto

Agosto tem o dom de nos surpreender; umas vezes com tragédias como, por exemplo, agora me lembro, o incêndio no Chiado, em Lisboa, a morte de Diana, princesa de Gales, as recentes inundações na Índia ou os incêndios em Monchique, outras vezes com comédias como a do cantor David Carreira que faz um vídeo em que abandona um carro em andamento, dançando e cantando, ou a de Pedro Santana Lopes que abandona o PSD e lança um novo partido a que chama Aliança; no entanto, não passa de um mês excêntrico e cujas excentricidades, não lhe sendo exclusivas, por acontecerem em período de férias, são naturalmente mais rubricadas e sentidas. Igualmente agosto nos surpreende com diálogos informais e improváveis, seja à mesa do café ou na maré-baixa à espera da onda, seja no mercado de peixe regateando preços ou no areal escaldante de papo para o ar, como estes que respiguei ocasionalmente nas minhas deambulações de veraneante incaraterístico. Primeiro diálogo – Duas jovens e vulgares banhistas que se cruzam numa banca de peixe cada qual com o seu lulu ao colo e, de pronto, trocando com eles carícias e mimos. E pergunta a do cabelo preso, referindo-se ao cachorro da do cabelo solto: – É menino ou menina? Resposta vaidosa da segunda, beijando o seu canídeo: – É menina e chama-se Maria. E retruque a primeira: – Pois o meu é menino e chama-se José. E, então, um ouvinte circunstancial que chalaceia para quem quer ouvir: – Ora vejam esta, agora para não haver, de futuro, dúvidas vou ter de tratar o meu filho por macho José e a minha filha por fêmea Maria. Segundo diálogo – Agora, mais adiante, numa esplanada aberta ao mar, um trio que presumo de reformados modestos parolam sobre as suas pensões e respetivas reduções e evidentes apreensões. E atira o fivelas do grupo: – Já sabem que o António Costa promete um aumento de 10 euros mensais nas nossas pensõeszecas para o ano. Sarcástico a cáustico vocifera o mais anafado do trio: – É preciso ter muita lata e falta de respeito, pois o que faremos com um aumento de 34 cêntimos, arredondados por excesso, por dia? O último dos três que me parece o mais filósofo sai a terreiro e dispara: – Olha, passamos a comer mais dois papos-secos por dia com meia sardinha de conduto e muito caladinhos a ver se não nos levam os 34 cêntimos no próximo aumento do preço das cebolas e dos tomates. Terceiro diálogo – Já ao cair da tarde, no bar do cais, dois jovens que me parecem desempregados pelo seu ar displicente e vário conversam sobre currículos, oportunidades e dificuldades de trabalho. E o do cabelo rabo-de-cavalo ironiza: – Vê lá bem, meu, este António Costa anda bué grisado: então deu-lhe para convidar os jovens que emigraram de 2011 a 2015 a regressarem com a promessa de redução de 50% no pagamento do IRS e ajudas no realojamento. E remata o de cabelo crista-de galo: – Eh! Mano, ainda se lhes prometesse trabalho, agora prometer-lhes desconto sobre um rendimento que eles nem sequer conseguem é mesmo de baixa política. Diálogos finais – Com certeza que aconteceram muitos, por exemplo, sobre a guerra da SIC com a TVI pela contratação dos pesos-pesados da comunicação com milhões, intrigas e traições à mistura, sobre os helicópteros Kamov usados no combate aos incêndios, quando são proibidos na Europa, sobre as negociatas do bloquista Robles numa clara demonstração do olha para o que digo não olhes para o que eu faço... ou ainda sobre o comboio da polémica que o PS alugou para a sua rentrée, transportando apoiantes de sul para o norte. Tal e qual: – Então, querem lá ver, no antigamente arrebanhava-se o povo levando-o de camioneta às manifestações de apoio e propaganda, mas agora a coisa está mais sofisticada. – Ora, afinal, pensando com cabeça, o que mudou foram só mesmo as moscas. Ou estoutro sobre a saída da Cristina Ferreira da TVI para a SIC: – Olha-me esta, a Cristina vai abandonar o Goucha. – É estranho é, pois na mesma capoeira até é fácil conviverem um galo e uma galinha. – Disseste um galo e uma galinha? Hum, essa afirmação de género não me parece bem explicada. E pronto, este foi, sem dúvida, um agosto pleno de contrastes e inconsequências a dar-nos voltas à mioleira. Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
DM

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12 setembro 2018