1. Em 9 de Maio perfazem 69 anos que Robert Schuman fez o seu célebre “Discurso” – assinala o Dia da União Europeia (UE) –, donde transcrevo: "A gestão comum das produções do carvão e do aço assegurará de imediato o estabelecimento de bases comuns de desenvolvimento económico, primeira etapa da Federação Europeia, e mudará o destino destas regiões que há muito se entregavam ao fabrico de armas, das quais foram as principais vítimas. (…) O estabelecimento desta unidade poderosa de produção aberta a todos os países, (…) lançará os alicerces concretos da sua unificação económica".
A mensagem era densa: o carvão e o aço que foram instrumentos de guerra e de destruição, poderiam constituir as bases da paz e do desenvolvimento europeu. E, de facto, assim foi: Europa foi “laboratório de paz e de progresso” como nunca se viu na sua história, que atrai novos Estados a aderirem a este Projecto, apesar do Brexit – à deriva, sem solução, o que deve fazer pensar! Jean Monnet, com os seus colaboradores, preparou o Plano da União, com base numa via de pequenos passos: essa a essência do método comunitário. Ele próprio declarou: "Podemos deixar as coisas tal como estão, mas se nada fizermos, o destino encarregar-se-á de decidir a nosso desfavor as actuais dificuldades".
2. Para superar a actual crise – parece que a UE não recua nem avança na integração política –, quando potentes forças agem nos bastidores para que imploda, a via não é a preconizada pelos soberanistas, mas de mais Europa e mais cidadania europeia. Este é o único caminho para que um europeu não se sinta estrangeiro noutro Estado europeu, para que haja relações laborais e comerciais mais intensas, para que se complete a união económica e monetária – uma verdadeira união bancária, uma fiscalidade europeia, um tesouro público europeu. Alguns falam em abandonar o euro e regressar às moedas nacionais (em Espanha, algumas moedas de peseta já eram furadas), o que seria uma tragédia; bem sabemos ao que nos levava o escudo a desvalorizar e a empobrecer-nos em tempos de crise. Todavia, parece-me difícil uma moeda única sem orçamento comum, sem maior aproximação em matéria social, sem acção concertada no mercado do trabalho, na competitividade: estes e outros problemas reclamam mais Europa. Aliás, importaria também um maior crescimento económico, prosseguir grandes empreendimentos de que Europa carece, mormente em infra-estruturas de transportes e energéticas, mas ainda promover um direito do trabalho europeu, uma política energética comunitária, uma política migratória comum.
3. Entre 1986 e 2011, Portugal recebeu 80,9 mil milhões de euros em fundos estruturais e de coesão, o que corresponde a nove milhões de euros por dia injectados pela UE no País, como concluiu o estudo “25 anos de Portugal Europeu”. E Portugal vai receber quase 24 mil milhões de euros de fundos de Bruxelas no próximo “quadro de apoio 20-30”. Como se sabe, esse dinheiro não cai do céu, sai dos bolsos de outros cidadãos de outros Estados europeus: trata-se dum sistema de solidariedade a nível comunitário, incomum no mundo, em que países mais ricos contribuem mais para o desenvolvimento de outros.
Quando se fala de UE muitos pensam logo nas estruturas centralizadas e burocráticas de Bruxelas, nos técnicos que enxameiam esses corredores – não eleitos, mas que muito decidem –, sem dúvida domínios que carecem de reforma urgente. No entanto, UE é muito mais que isso: nos nossos dias, muitas tarefas inadiáveis e que nos preocupam não se podem realizar à escala nacional; daí que só na UE poderemos colmatar a rarefacção das fontes energéticas, obstar à destruição da biosfera, à difusão de epidemias, corrigir a volatilidade dos mercados financeiros, resolver o grave problema dos movimentos migratórios, e, claro está, dos inesperados modos de insegurança que perturbam as sociedades, desde os redutos de marginalidade aos novos tipos de terrorismo que desencadearam uma espécie de guerra sem fim à vista. Fechar fronteiras é arruinar o desenvolvimento económico e abrir caminho à miséria – como se vê noutras partes do globo. Nenhum dos Estados herdados do passado está em condições de garantir a segurança interna e externa dos seus habitantes; por isso, a paz, as liberdades, viver com segurança social – que tantos, de outras partes, chegando à Europa, ansiosamente buscam – só poderá manter-se no quadro comunitário.
4. A solução à crise que grassa na UE – e ela não é menor nos Estados-membros – passa por mais Europa; o facto de se atribuir escassa importância às eleições europeias de 26 de Maio mostra como estamos longe da UE pensada pelos líderes europeus fundadores (década de 1940-50), que propugnavam por uma Europa federal. Daí que, ao invés de muitos, que atribuem maior importância às próximas eleições legislativas, eu conclua que não são menos importantes as próximas eleições europeias; a estas dedicaremos a próxima reflexão.
O autor não segue o denominado acordo ortográfico
Autor: Acílio Estanqueiro Rocha