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Desapoio Judiciário

A constituição garante o acesso ao direito e jurisdição efectiva, independentemente da condição económica.

Concretizando este princípio concebeu-se um sistema de protecção jurídica, vulgo apoio judiciário.

Permite o acesso gratuito a um Advogado e à dispensa de pagamento de custas.

A lei está bem pensada. Mal pensada está, porém, a sua concretização e, mais ainda, a sua interpretação pelos serviços da segurança social.

Deixando de lado os requerimentos, os documentos – alguns deles exigidos sem suporte legal – ou informações quando o Estado tem, ou deveria ter, acesso porque conhecidos dos seus múltiplos organismos e entidades, bem assim as notificações para pronúncia e as cominações da sua falta que, muitas das vezes, implicam conhecimentos jurídicos que o requerente não tem e a eles não pode aceder, pois grande parte por isso recorre a este benefício. Deixando tudo isto de lado temos que, quantas vezes, os serviços da segurança social não decidem em tempo e o tempo são 30 dias corridos com hipótese de sua suspensão em certas circunstâncias.

O legislador – e bem – porque estão em causa direitos fundamentais ultrapassou – ou melhor, procurou ultrapassar – essa possibilidade através do que se designa deferimento tácito. Em termos simplistas significa o conceder do pedido se, no prazo estabelecido, nada se decidir.

Parece um regime simples. Não é! E não é, conquanto – à semelhança de tantos outros casos – o Estado, o mesmo Estado, resolve não fazer caso da lei.

Quer dizer, mesmo ultrapassado o prazo, mesmo invocado, ignora o deferimento tácito e decide como melhor lhe aprouver. E se o beneficiário pretender invocar o seu direito que estaria já consolidado é bem que impugne judicialmente, sob pena de nada valer o que a lei quis que valesse. E aquele que pede um Advogado porque não consegue custeá-lo vai ter a capacidade de por si recorrer? Não vai!

Deferido tacitamente o pedido, este não podia deixar de produzir efeitos. Não vamos cansar o leitor com considerações jurídicas concretas no sentido da inadmissibilidade desta actuação. Mas, mais não fosse, tal traduz uma fraude à lei; o legislador, ao definir o deferimento tácito visava, por um lado, imprimir um impulso à administração de modo a que não seja ineficiente e, por outro lado, permitir que o requerente – futuro beneficiário – não ficasse condicionado à ausência de resposta da administração; não pretendia permitir, certamente, se pudesse invocar o benefício do apoio judiciário nesses termos para, depois, por uma decisão a destempo, poder até ficar sem o mesmo! Isto é, pela lei os cidadãos podem ver concedido o benefício, mas passados uns dias ou meses podem ver-se confrontados com uma (in)segurança social a dizer que o seu direito, já não existe, muitas vezes com intrincadas situações (a última conhecida foi a de num procedimento com uma decisão final já impugnada judicialmente, ter retrocedido, sem qualquer justificação, de maneira transviada, ilegal e após um ano, à fase inicial) e consequências nos actos judiciais já praticados por interpretações – aqui de alguns Tribunais – manifestamente inconstitucionais quanto a retroactividades inaceitáveis.

Acresce que nesta sede a Lei que regula este benefício – a qual é especial e, portanto, prevalece sobre a lei geral – é inequívoca, não devendo o intérprete fazer distinções que o legislador não fez.

Só vemos uma razão para tal vir sucedendo: a tentativa de escamotear a incapacidade dos serviços competentes decidir em prazo!

E só vemos uma solução: o Legislador olhar para este sério e grave problema, sob pena de cercear ainda mais os direitos de quem está já vulnerável em razão da sua condição económica; deve, de uma vez por todas, de forma clara e inequívoca, proibir que, deferido tacitamente um pedido de benefício do apoio judiciário, seja desconsiderado por decisões ulteriores expressas da segurança social, salvo ilegalidades manifestas imputáveis aos requerentes. Responsabilize-se quem se deva responsabilizar pela ineficiência, mas proteja-se a certeza e segurança jurídicas.


Autor: António Lima Martins
DM

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16 dezembro 2021