1. No Portugal democrático em que vivemos que data é mais importante: 25 de abril de 1974 ou 25 de novembro de 1975?
Recordo, em linhas gerais, um conjunto de datas e de factos.
2. Em 25 de abril de 1974 o MFA – Movimento das Forças Armadas pôs termo ao regime que vigorava desde o golpe militar desencadeado em Braga em 28 de maio de 1926. A Junta de Salvação Nacional, então constituída, anunciou três objetivos a atingir: democratizar, descolonizar, desenvolver.
Relativamente ao primeiro daqueles objetivos havia dois modelos de democracia: a chamada democracia popular, em vigor na União Soviética e seus satélites, e a considerada democracia ocidental, existente em países como a Inglaterra e os Estados Unidos da América do Norte.
Houve todo um esforço no sentido de se implantar em Portugal uma democracia popular através do surgimento do PREC – Processo Revolucionário em Curso.
3. Descontente com o evoluir da situação o Presidente da República, general António de Spínola, em 28 de setembro de 1974 apelou a que a maioria silenciosa se manifestasse mas os adeptos da democracia popular boicotaram a manifestação. Mobilizaram brigadas populares e puseram camiões em todas as entradas de Lisboa barrando a passagem a quem ia do Norte. Spínola demitiu-se e o caminho rumo à democracia popular foi progredindo.
4. Apreensivo com uma pretensa matança da Páscoa o ex-presidente Spínola tentou em 11 de março de 1975, sem sucesso, um golpe militar contra-revolucionário.
A instauração de uma democracia popular deu, então, um passo de gigante com nacionalizações na indústria e a reforma agrária, meios indispensáveis para abolir a propriedade dos privados e transformá-la em propriedade pública do Estado.
Entre março e agosto nacionalizaram-se a banca e os seguros, a TAP, a marinha mercante, os transportes rodoviários e a grande indústria: petróleos, gás, eletricidade, telefones, cimentos, construção e reparação naval. Ao todo, mais de 100 grandes empresas privadas.
Expropriaram-se (ou ocuparam-se) quase todos os latifúndios de Beja, Évora, Setúbal e Santarém.
Nacionalizados foram também importantes Meios de Comunicação Social.
Fizeram-se saneamentos selvagens.
5. O galopar em ordem à democracia popular gerou uma onda de descontentamento que deu origem, em 19 de julho de 1975, em Lisboa, a um gigantesco comício realizado na Alameda D. Afonso Henriques.
A vaga de indignação, avolumada entre os católicos pela situação imposta na Rádio Renascença e pelo cerco ao Patriarcado de Lisboa, alastrou a vários pontos do País, tendo originado grandes manifestações. Uma delas aconteceu em 10 de agosto, em Braga.
Porque se estava na iminência de, tendo saído de uma ditadura, se entrar noutra, os defensores de uma democracia de estilo ocidental reagiram em força e aconteceu o 25 de novembro de 1975, de que saíram vencedores.
6. Vencidos, os defensores da democracia popular ainda conseguiram deixar marcas na Constituição da República de 1976 com várias disposições de inspiração marxista e leninista, desaparecidas nas revisões de 1982 e de 1989.
Insistem em dar sinais de vitalidade. Mostras disso, por exemplo, a desvalorização do 25 de novembro; a forma como lembram frequentemente os crimes praticados à sombra da ideologia fascista e silenciam os que a ideologia comunista provocou; a persistência com que alertam para os riscos da extrema direita não mencionando os da extrema esquerda; a visão distorcida de factos históricos.
7. Em todo o processo, é imperioso dizê-lo, houve excessos que se lamentam. Praticaram-nos gente dos dois lados e não de um só. E é desonesto culpabilizar pessoas por erros que se não prova tenham cometido.
8. Perante o que lembrei – e muito mais podia ter dito – fácil é responder à pergunta inicial: a quem devemos mais a situação em que vivemos: ao 25 de abril ou ao 25 de novembro?
Autor: Silva Araújo
Datas & factos

DM
22 abril 2021