Dá gosto ver a cidade retomar o seu bulício natural. A pandemia tinha-lhe roubado os turistas e as esplanadas de desertas e tristes como uma viuvez, apresentam agora uma vida que traz e empresta a quem observa, uma alegria de regresso. Uma cidade sem gente é um fantasma O silêncio da ausência e a tristeza da viuvez e, por muito que se saiba e compreenda que tudo foi preciso para suster a pandemia, a verdade é que a razão tem a cor do branco do algodão, mas a paixão tem a cor viva do entusiasmo. Braga é a minha cidade e por muito que tenha cirandado por aqui ou por ali, visto, fotografado ou apreciado, a verdade é que quando regresso a Braga, sinto-lhe o perfume como o sabor dum paladar de criança. Sinto-o e gosto. Nada disto é exagerado: o cronista vê, o cronista conta; conta não só o que vê mas também conta o que sente. E nesta circularidade põe-se a lembrar como era há anos a cidade de Braga, em tempo de férias. Tempos que a memória aquece e o tempo não apaga. Faz o ninho na saudade. Não há muito tempo os bracarenses despejavam-se nas praias da Póvoa de Varzim, Apúlia, Âncora ou Moledo e a cidade entrava num silêncio de escola sem alunos ou igreja sem fiéis. Era o silêncio do vazio, tão oco como tudo o que não tem interior. Agora não é assim; as pessoas de Braga viajam mais do que nunca, mas não se nota qualquer diminuição de transeuntes na cidade; nas suas artérias há gentes que enchem esplanadas e ruas, dando a noção de que a cidade não se despejou; assim sendo, porque assim é em todos os dias deste verão, demonstra quanto esta cidade é grande e como atrai como destino de férias. Isto faz lembrança, não por semelhanças mas por contrastes quando pensamos nas cadeiras das esplanadas atadas umas às outras como condenados de galés, numa expiação de culpa que não sabemos que pecado cometeram. Pareciam tristes, amortalhadas para morrer, perguntando a quem as observava, mas afinal somos culpadas de quê? Da pandemia, seria a resposta. A pandemia fazia de carcereira e foi o juízo dos portugueses e a maneira como aceitaram a vacinação, que quebraram o pesadelo. É o fim do martírio dos inocentes. Mas o que atrai os turistas que nos visitam? O Sameiro, o Bom Jesus ou a Santa Marta tecem uma teia onde as paisagens se deitam entrelaçadas num aconchego de deleites. Estas jóias, encrustadas neste colar de belezas paisagísticas, talvez não chegue para explicar tudo. Por outro ângulo de análise, Braga é uma cidade onde o profano e o religioso se abraçam sem litígio. Depois Braga é uma cidade plana: desde o sopé do Sameiro até Esposende não existem grandes desníveis. Nem se sobe com custo, nem se desce em vertigem. Mas por si só, cada uma destas partes, ainda nada explica. Temos a elegância do trato, a maneira simpática de receber, a prontidão do obséquio numa atitude de fidalguia que marca a nossa maneira de saber estar. No entanto, cada uma de per si, é asa que não voa. Então o cronista julga que “o todo é maior que a soma das partes “e, numa perspetiva holística, esta adição cria, de Braga, mais que uma imagem, mais um encontro com a maneira de sentir da cada pessoa que nos visita, quer na sua dimensão religiosa ou profana, quer com a natureza ou com as gentes. É uma assunção de coisas que viram subjetividades. Para cada paladar, seu gosto. É o lago tranquilo da assunção. Se o perfume se não avalia pelo tamanho do frasco, também a mística não se avalia pela origem dos misticismos. Truncar as partes era fazer da águia um morcego.
É assim Braga, esta cidade que amo.
Autor: Paulo Fafe