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Cuidados continuados e paliativos

1. A leitura da sétima página do «Diário do Minho» do passado dia 05 despertou em mim um forte sentimento de indignação, e até de revolta. E digo já porquê: porque numa sociedade onde há dinheiro para custear abortos provocados não o há para proporcionar aos doentes melhor qualidade de vida.
2. Essa página relatava um pormenor da última sessão da Assembleia Municipal de Braga.
Filomena Bordalo informou os deputados municipais da situação vivida na Unidade de Cuidados Paliativos «O Poverello», a funcionar em Montariol. Existem ali três unidades da Rede Nacional de Cuidados Continuados: uma de média duração e reabilitação, com 24 camas; uma de longa duração, também com 24 camas; uma de cuidados paliativos, com dez camas.
Para prevenir e controlar a dor, uma caraterística das unidades de cuidados paliativos, é indispensável para cada doente pelo menos uma seringa infusora. Como precisasse de dez dessas seringas e apenas possuísse quatro, – cada uma delas custa cerca de 1.200 euros – a Instituição solicitou, em vão, o apoio da ARS/Norte. Foi-lhe dito que a medicação fosse administrada por via injetável, sublingual ou retal.
Informados da situação, os presidentes de Junta de Padim da Graça, União de Freguesias de Arentim e Cunha e a Junta de Tebosa ofereceram uma dessas seringas. Os deputados municipais decidiram oferecer com o mesmo objetivo o valor das suas senhas de presença.
3. É de louvar – e faço-o sem quaisquer reticências – o gesto de solidariedade que a informação gerou. Mas não deixo de referir a necessidade de uma reflexão serena e desapaixonada sobre a forma como são geridos os dinheiros públicos e sobre a situação em que se encontram os doentes, inclusive os que, clinicamente, estão em fase terminal.
Numa altura em que se fala tanto no direito de todos à saúde, é importante refletir sobre como se concretiza, na prática, o exercício desse apregoado direito.
É desumano deixar de apoiar essas pessoas. É desumano não lhes dar, seja qual for a situação clínica em que se encontrem, a possível qualidade de vida. É desumano deixar que as pessoas morram de qualquer maneira.
4. Perante o dinheiro gasto com o crime do aborto provocado, é legítimo perguntar se, em vez de gastar dinheiro para matar, não é mais aconselhável gastar dinheiro para ajudar a viver.
5. Fazem falta unidades de cuidados continuados, nelas incluindo os cuidados paliativos. A sua existência libertaria camas de hospitais, ocupadas por doentes que não têm para onde ir. Levaria os responsáveis pelos lares de idosos a repensarem a sua atuação, uma vez que alguns deles, sem serem reconhecidos como tal, funcionam, na prática, como unidades de cuidados continuados.
6. Unidades de Cuidados Continuados e Paliativos fazem falta, insisto. Se o Estado se sente incapaz de as criar, que apoie quem se disponibiliza para prestar esse serviço.
Mas que apoie mesmo. Não é permitir a criação de estruturas e depois retirar o tapete.
Tais unidades não vivem sem dinheiro e grande parte das pessoas necessitadas desses serviços não tem capacidade económica para custear a totalidade das despesas. Uma correta gestão dos dinheiros públicos não levará a que sejam comparticipadas?
7. Insiste-se muito no Estado centralizador, mas a prática demonstra que este não dá a resposta necessária. Acena-se com o papão do lucro de particulares à custa de doentes e idosos. Esquece-se que entre o setor público e o setor privado há o setor da economia social, que o bem comum exige seja estimulado. Não visando um lucro de que beneficiam particulares, pode ser um bom parceiro do Estado na solução deste problema. Há provas disso. Mas ser parceiro não significa ser criado de um Estado mandão, arvorado em senhor e dono de tudo e de todos, capaz de alterar as regras do jogo sempre que lhe der jeito.

Autor: Silva Araújo
DM

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9 maio 2019