Segundo dados de um estudo da Marktest, cerca de 2 milhões de portugueses têm crédito à habitação. Por outro lado, segundo o Relatório de Acompanhamento do Mercado de Crédito, publicado em julho último, o prazo médio dos créditos à habitação na carteira das instituições financeiras era de 33,5 anos no final de 2021. Também, segundo o Banco de Portugal, a esmagadora maioria dos créditos concedidos desde 2019 foram contratualizados com uma taxa de esforço (percentagem do rendimento afeto ao pagamento do empréstimo) inferior a 27%.
Sabemos também que as taxas de juro dos empréstimos têm vindo a aumentar, por força da alteração dos indexantes associados (a Euribor a 3 meses que ainda em 1/7/2022 era de -0,176%, está agora a 1,976%. Já a Euribor a 12 meses fixou-se nos 2,842%).
Combinando este complicado puzzle, sabemos que a situação orçamental das famílias portuguesas não é fácil: por um lado vêm-se confrontadas com uma taxa de inflação que ronda os 10% em 2022, sendo que o rendimento da grande maioria não aumentou nem aumentará em 2023 nessa ordem de grandeza. Por outro lado, considerando que muitas famílias possuem crédito à habitação, como vimos, as prestações destes créditos estão a aumentar significativamente, uma vez que a maior parte dos empréstimos foram negociados a uma taxa de juro variável e estas, despois de anos estagnadas, têm vindo a evoluir nos últimos tempos significativamente, como vimos.
Por esta razão, o Governo fez publicar no final de novembro uma lei que visa mitigar os efeitos do aumento das taxas de juro no crédito à habitação com valor em dívida igual ou inferior a 300.000€.
Segundo esta lei, no prazo de 45 dias após a sua entrada em vigor (26/11/2022), os Bancos devem avaliar se, em resultado do aumento da taxa de juro, os mutuários sofreram um agravamento significativo da taxa de esforço, como seja, por exemplo, esta represente 36% em resultado de um aumento de 5 pontos percentuais em relação à taxa de esforço que tinham há um ano. Caso os clientes bancários se encontrem numa das situações previstas na lei, ou tenham uma taxa de esforço de, pelo menos 50%, os Bancos são obrigados a avaliar a capacidade financeira dos seus clientes, tendo em vista determinar se existe risco efetivo de incumprimento do contrato de crédito. Os próprios clientes podem tomar a iniciativa de comunicar aos Bancos factos que indiciem uma degradação da sua situação financeira.
Durante o prazo de vigência deste diploma (fim de 2023), os Bancos devem proceder à avaliação da taxa de esforço dos mutuários 60 dias antes da refixação da taxa de juro contratualizada.
Confirmando-se que os clientes se encontram em risco de incumprimento do contrato de crédito, mas dispõem de capacidade financeira para evitar o incumprimento, os Bancos devem apresentar propostas de renegociação dos créditos, as quais podem incluir o alargamento do prazo do empréstimo, a fixação de um período de carência, a redução da taxa de juro aplicável ou o diferimento de parte do capital para uma prestação futura, por exemplo.
Os Bancos não podem agravar as condições do crédito nem cobrar comissões pela renegociação do crédito.
Aconselho vivamente todos os clientes bancários com crédito à habitação a contatarem com a RACE (Rede de Apoio ao Cliente Bancário) tendo em vista analisar com os respetivos técnicos, a situação dos seus créditos bancários. Na região, este serviço é prestado de forma gratuita, confidencial e com elevado rigor técnico, pelo CIAB-Tribunal Arbitral de Consumo.
Autor: Fernando Viana