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Contradições sociais

O desenvolvimento de um país mede-se habitualmente pela apresentação de indicadores sociais e económicos. Supostamente, quanto mais desenvolvido for um país, mais feliz será a sua população.

Lembro-me de, na escola, enquanto aluno, ser medido o desenvolvimento dos países, entre outros, pelo número de carros existente por cada 100 habitantes, ou pelo de aparelhos de televisão existentes nas habitações, bem assim como por outros indicadores de conforto como sejam os frigoríficos ou os aparelhos de ar condicionado, ou os computadores disponíveis nos agregados familiares.

Se bem pensarmos esta forma de apresentar e medir o Desenvolvimento é estereotipada e encerra grandes contradições, sob o pretexto de tudo medir, objetivar e categorizar.

De facto, que felicidade e quão desenvolvido se sente o habitante de uma grande cidade, calcorreando quilómetros de manhã, de automóvel, a caminho do emprego, no meio do trânsito caótico e rodeado por todos os lados de poluição atmosférica, sonora e visual?

Que desenvolvimento encerra o país, em que a generalidade dos habitantes possui frigoríficos e arcas congeladoras que servem para acomodar os frangos, a carne, as pizas e muitos outros alimentos, que permitem o fácil consumo e ingestão de grandes quantidades de alimentos altamente calóricos que contribuem para tornar a população obesa e com graves problemas de saúde associados (de onde se destaca a hipertensão, o colesterol elevado, a diabetes, etc.)?

Que desenvolvimento e que futuro se espera de um país, onde o entretenimento generalizado da população abaixo dos 60 anos, é navegar na Internet, visitando redes sociais, consumindo séries de televisão através da Netflix ou da HBO e cuscando a vida alheia no Instagram ou no Facebook?

Acima dessa idade, diminui a adição pela Internet, mas a maior parte das pessoas concentra-se em sofás para deglutir passivamente programas televisivos, onde predominam as telenovelas, os reality shows e os concursos.

Quando os cientistas falam de uma emergência climática, provocada pela espécie humana, que fazemos para além de ligar os aparelhos de ar condicionado, cada vez mais usuais, desta forma fingindo que nada se passa?

E, embora todos lamentem a poluição elevada que nos rodeia, o que fazemos verdadeiramente para a combater?

Aparentemente muito pouco ou mesmo nada. De facto, por exemplo, o comércio eletrónico nunca vendeu tanto, com as enormes quantidades de resíduos de papel e plástico que lhe estão associados, para além das toneladas de resíduos poluentes que o transporte de produtos implica.

Nunca vi tantos resíduos de embalagens, plástico, vidro e papel desperdiçado como nos dias que correm.

Na verdade, quando se fala em desenvolvimento sustentável, ou seja, em consumir de forma equilibrada, satisfazendo estritamente as nossas necessidades, não delapidando recursos naturais não renováveis e, de forma a garantir às gerações vindouras um planeta em que possam viver da mesma forma que as gerações que as antecederam, tudo não parece mais do que uma imensa hipocrisia e um enorme embuste.

O nível de exigência política colocado para enfrentar este estado de coisas é muito reduzido e, consequentemente o comportamento da maior parte das pessoas tende a não se alterar. Muitos comportamentos negativos, para mudarem, requerem a adoção de um nível de disciplina pessoal e social muito elevado, que pura e simplesmente não existe.

Laissez-faire, laissez-passer, o lema do liberalismo económico do século XIX, parece ser também o lema da libertinagem social do século XXI, onde cada um faz o que quer, sem grandes preocupações. Tenho por mim que tudo se paga e o preço será elevado.


Autor: Fernando Viana
DM

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29 maio 2021