1.Apenas mais umas breves notas sobre o sentido da democracia, do acto eleitorale do papel de um líderem democracia. Sendo o acto eleitoral um dos principais pilares da democracia (o outro é a execução prática que os eleitos fazem das promessas eleitorais), a eleição deve ser um momento de grande verdade e responsabilidade. É por isso que os eleitores também precisam de regras capazes de escrutinar o trabalho dos eleitos. Um dos males da democracia que se foi instalando é o vale tudonas eleições e, depois de eleitos, fazer o que queremcomo se fosse em nome do povo. Os eleitos não se podem esquecer que estão a agir em nome do povo, não em seu nome nem dos seus interesses.
1.1. Sobre o sentido da democraciae daparte do eleitor, ela implica consciência dos problemas sociais e responsabilidade na escolha daqueles que vão executar a solução desses problemas. Cada eleitor deve, por isso, interessar-se por conhecer o melhor possível os problemas sociais para poder ajuizar das soluções adequadas e escolher os candidatos mais aptos para o fazer. Transformar o processo eleitoral numa campanha mais ou menos folclóricapara convencer os eleitores, sem respeito pela verdade, tem sido um dos grandes factores de perversão democrática. Tudo o que contribua para tornar a eleição num processo menos consciente perverte o sentido da democracia.
1.2. Da parte dos que se apresentam como candidatos, o sentido de democracia implica verdade nas propostas apresentadas, competência e honestidade na acção, fidelidade às promessas feitas, sejam eles autarcas, deputados, Governo. A democracia não pode funcionar sem ética. Não apenas a ética republicana da lei que é feita pela maioria que está no poder, mas a Ética que está para além da transitoriedade das leis e se inscreve no coração do Homem.
1.3. Civismo democrático. A democracia não pode ser encarada como uma guerraentre cidadãos, mas como uma disputa saudável para conseguir algo melhor. Há expressões de tipo guerreiro como lutae combate políticoque contribuem para perverter o sentido da convivência democrática. Não pode haver “guerras democráticas”, mas apenas disputas de pontos de vista e de interesses de grupos diferentes que procuram defender os seus pontos de vista e os seus interesses de classe, contanto que se procure harmonizar solidariamente com o todo social que é o país. É normal haver diversidade em qualquer grande grupo (e, afinal, o país é um grande grupo); mas, se os membros de um grupo entrassem em guerra uns com os outros sem terem em conta o sentido de solidariedade social, provocariam a sua própria desagregação. Valorizar as diferenças é um direito de desenvolvimento no grupo. Tem de se reconhecer que o marxismo foi muito infeliz ao introduzir o espírito guerreiro de luta de classes como forma de resolver essas disputas, porque numa democracia há um elo que nunca se pode quebrar: a solidariedade social. E uma guerra não respeita elos de solidariedade: ou há vencidos ou há vencedores, nunca há uma sociedade solidária e tolerante, como exige a democracia.
2. Sentido do acto eleitoral. A democracia é uma espécie de contrato sociallivremente celebrado entre eleitores e eleitos. Por isso é que as eleições devem ser livres e conscientes. Conscientes, porque cada eleitor deve saber o que quer e escolhe livremente o candidato mais apto para o representar, exigindo-lhe, depois, responsabilidade na execução. É por tudo isto que a democracia implica valores cívicos e éticos sem os quais não pode funcionar. Entre eles, implica também uma aprendizagem permanentede responsabilidade cívica e de desenvolvimentopara que todos se possam realizar pessoalmente e profissionalmente como membros do grupo.
3. O papel de um líder num grupo democrático. Há seres, como as abelhas, que não conseguem sobreviver sem terem um líder, a abelha rainha do enxame; os humanos sobrevivem pessoalmente sem precisar de um líder, mas não conseguem sobreviver socialmente sem um líder. Qualquer grupo humano precisa de um líder, seja ele mais directivo ou menos directivo, conforme a maturidade do mesmo grupo. Porque é o líder que faz a união e a motivação do grupo e converte a motivação de cada um na motivação geral; é o líder que funciona como consciência e guia da unidade e da acção do grupo; é o líder que ouve, unifica, motiva, dinamiza, entusiasma, faz avançar na acção para o bem comum. Por isso, o líder tem que ser flexível e seguro, acolhedor e sensível para ouvir a todos e forte para decidir em nome de todos, inteligente e capaz de prever o futuro das suas decisões, apaixonado e capaz de apaixonar, abrangente e metódico, capaz de assumir os fracassos e avançar de novo por outros caminhos. O líder tem de privilegiar o contacto com o povo, transmitir-lhe esperança, uni-lo, motivá-lo, defender o seu projecto de vida e de interesses. Tem de ter um perfil pessoal abrangente e carismático, competência intelectual e emocional, audácia para ir à frente do seu grupo. É por isso que não é líder quem quer, mas apenas quem nasceu com qualidades para isso. Porque o líder nasce, não se faz.
(Nota: o autor não escreve conforme o Acordo Ortográfico)
Autor: M. Ribeiro Fernandes