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Como a TV "resumiu" o debate Marine-Macron

Os anos foram passando e hoje, na rádio, na TV e nos jornais (quanto mais na "internet"!), aqueles que "arranham" um pouquinho de francês, são a excepção, uma espécie de aves raras. E tudo isto é inacreditável, inqualificável, inesperado (e mesmo disparatado), uma vez que hoje, por gentileza desses países, temos mais de milhão e meio de luso-descendentes a viver na França, Bélgica, Suíça, Mónaco e Luxemburgo.

2 – Daí que um debate televisivo entre os 2 qualificados para a 2.a volta das eleições francesas fosse dobrado em português...). A curiosidade a propósito do debate, minha e de tantas pessoas, por essa Europa fora, era imensa. Foi anunciado, em Portugal, que a SIC e a RTP iriam transmitir o debate, de cerca de 3 horas. A TVI fazia ainda melhor: enviava por mais de uma semana a Paris, a sua "especialista" Judite Sousa. A minha surpresa foi, então, imensa quando em ambas as estações (SIC e RTP), o "debate" que se ouvia ("por cima" das imagens de Marine e Macron) era entre 2 vozes, aliás 4, falando em português e abafando as originais, em francês. Em ambas as estações havia também uns comentadores (as caras do costume), à espera de falar, impacientes. O debate era vivo e rápido. E as traduções igualmente, pois devia haver algum desfasamento de segundos, para que tal acontecesse.

3 – Surpresa e decepção: ao fim de 32 minutos "acaba" o debate e entram os comentadores!). Fiquei incrédulo: que falta de respeito pelos espectadores e pelos 2 candidatos a PR da França... Primeiro na RTP e logo a seguir na SIC, no tranquilo pressuposto de aquilo estar a ser uma "estopada" (ou algo que, pela vivacidade, estava bem acima da capacidade intelectual e cultural dos portugueses) os moderadores cortam a voz a MarineLePeneaMacrone passam aos sábios "comentadores". E daí para diante, as mais de 2 horas de debate que restavam, não foram (como prometido) ouvidas em Portugal. Bem se apregoa que a Censura acabou, depois de 1974...

4 – Como é que alguém pode comentar um debate, quando ouviu apenas a 5.a parte?). Foi a triste figura que fizeram nas 2 estações, Bernardo Pires de Lima, João Galamba, Paulo Dentinho e o próprio Leitão Amaro. De mais a mais, es- tavam a tomar-nos por parvos: comentar e tirar conclusões de algo que ainda não havia acontecido! Em que, como se diz em Portugal, "a procissão ainda ia no adro".

5 – Provavelmente só deram 32 minutos para não mostrar o valor das ideias patrióticas de Marine). Ao contrário da opinião de alguns "comentadores", nacionais e estrangeiros, Marine não perdeu o debate. E estava mesmo a fazer uma excelente figura. Mas, ao contrário dos 32 min. iniciais a que tivemos acesso, dizem que, "milagrosamente", o resto do debate lhe teria saído menos bem. É fácil comentar assim, às escuras; a luz é só para os "iluminados". Os parolos e os saloios ficam de fora.

6 – De Marine Le Pen, o que eu pude ver). Marine é uma grande senhora, de aparência tipicamente celta (gaulesa). É bela, elegante, inteligente, valente, carismática, leal, séria... E defende a sua nação, a gloriosa França, um país tão cobiçado e invejado por estrangeiros: na Antiguidade foram os romanos (italianos); na Idade Média, foram os alemães e os ingleses, que por séculos ocuparam vastas áreas da França de hoje; no séc. XX é a paulatina imigração de argelinos, marroquinos e outros (9% da população, tudo agravado pelo fundamentalismo e pela taxa de natalidade).

7– De Macron,o que eu pude ver). Dizia Marine que ela é a candidata que defende o "pouvoir d'achat" (o poder de compra dos franceses); enquanto que Macron era o do "pouvoir d'acheter" (o poder de os outros comprarem a França). Alto funcionário bancário e ex-ministro que abandonou Hollande; um jovem ultra-liberal que agora diz "não ser carne nem peixe". Só tem 39 anos e é casado com uma senhora de 64 anos. Seguro dos seus apoios, impassível (lembrou-me Hillary...), algo postiço ("inventado" pelo sistema, para travar Marine), às vezes parecia saído dum daqueles filmes do Drácula, pálido e seco mas tenso, olhos verdes de réptil. Um novo Sarkozy mas sem o carisma deste.

8 – Etimologias: a cavala e o pavão). Para quem não saiba, Le Pen quer dizer "pavão", alcunha de algum trisavô que era vaidoso. Já Macron (vem do flamengo) é pior: deriva de "maquereau", "maqueron" (cavala, o peixe). Mas, como alcunha, já no séc. XIV significava "entremeteur", i. e., proxeneta, facilitador (relacionado com o inglês "to make", cf. DAUZAT, "Noms et prénoms de France").


Autor: Eduardo Tomás Alves
DM

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16 maio 2017