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Comemorações do Dia da Língua Portuguesa

A XIV Reunião Ordinária do Conselho da Comunidade dos Paises de Língua Portuguesa (CPLP), criou o dia 5 de maio como “Dia da Lingua Portuguesa e da Cultura”, data confirmada, em novembro de 2019, pela Organização da ONU para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).

Com o objetivo de participar nas respetivas comemorações, importa recordar, ainda que sumariamente, a história da sua formação.

No dia 27 de junho de 2014, alguns órgãos de comunicação social celebraram os 800 anos da língua portuguesa, uma vez que consideram o dia 27 de Junho de 1214, simbolicamente, o nascimento da nossa língua, por ser a data do documento escrito mais antigo que se conhece em português: o testamento de D. Afonso II. No entanto, alguns autores apontam outros documentos literários, escritos em português, ainda mais antigos.

A presença romana na Península durou até ao séc. V, pelo que durante mais de seis séculos, Roma influenciou as sociedades hispânicas, romanizando-as. De tal modo que os povos que habitavam o território do futuro Portugal, acabaram por esquecer os seus próprios idiomas e adotaram a língua latina do invasor, com uma civilização muito superior à dos povos bárbaros.

O latim vulgar (popular), foi trazido pelos soldados, pelos colonos e pelos mercadores. O latim literário era utilizado pelos autores clássicos nos seus escritos. Porém, foi o latim popular que, de evolução em evolução, veio dar não só a língua portuguesa, como todas as línguas românicas ou novi-latinas (o português, o espanhol, o francês, o italiano e o romeno). As únicas fontes existentes para o estudo das origens de qualquer língua, assim como para a sua evolução, são os documentos escritos. No entanto, é pertinente questionar se antes desses documentos, ou na falta de outros mais antigos, o português já existia.

Parece evidente que uma língua não surge num momento fixo, tornando-se impossível verificar qualquer data em que o latim desaparece e surge o português. Sendo o povo o verdadeiro senhor da língua, faz que as modificações se operem permanentemente e as formas se desenvolvam e evoluam lentamente.

Os documentos em latim tabeliónico (notarial) mostram que já antes do séc. XII se escreviam palavras de feição nitidamente portuguesas, por ser muito difícil fugir à linguagem do povo. Assim, na evolução permanente só por alturas do séc. XII surge uma língua diferenciada, ou seja, o galego-português, assim chamada por ser falada por galegos e lusitanos. Daqui para trás é que se verifica uma barreira intransponível. Com a separação dos dois povos que falavam o galego-português é que a língua portuguesa começa a aparecer, ainda que timidamente, para atingir o seu auge no séc. XVI, enquanto o galego estaciona para ser absorvido pelo castelhano, no séc. XV.

Alguns estudiosos dizem que o primeiro documento literário escrito em língua portuguesa é um poema, de 1189, ou seja, a cantiga de amor do trovador Paio Soares de Taveiros dirigida a Maria Pais Ribeiro (a célebre Ribeirinha), favorita do rei D. Sancho I:

No mundo non me sei parelha/mente me for como vai/cá moiro por vós – ai! -/mia senhor branca e vermelha! Queredes que vos retraia?/ Quando vos eu vi em saia, /mau dia me levantei/ que vos enton non vi fea!/ E, mia senhor branq`e vermelha,/ mi foi mal dês aquel di`ai!/ E vós. Filha de Don Paai/ Moniz, e bem vos semelha / d`aver eu por vós guarvaia? /Pois, eu, mia senhor, d`alfaia / nunca de vós ouve nem hei / valia dua correa”.

O português em prosa literária aparece um pouco mais tarde, apontando alguns estudiosos um auto de partilhas, de 1192, documento que pertencia ao mosteiro de Vairão, dado à estampa por José Leite de Vasconcelos:

in christi nomine. Amen. Hec est notitia de partiçon e de divison que fazemos entre nos dos erdamentos e dos coutos e das onras e dos padroadigos das eigreijas que foron do nosso padre e da nossa madre em esta maneira: Rodrigo Sanchiz ficar por sa partiçon na quinta do couto de Viiturio, ena quinta do padroadigo dessa eigreija, en todolos erdamentos do couto e de fora do couto; Vasco Sanchis (…) Estas partições e divisões fazemos antre nos. Que valhan por en secula seculorum. Amen”.

Ainda mais tarde, surge, em 1214, o referido testamento de D. João II:

En nome de Deus. Eu, rei don Afonso, pela graça de Deos, rei de Portugal, seendo são e salvo, temente o dia de mia morte, a saúde de mia alma e a proe de mia molher, raia dona Orraca, e de meus filhos, e de meus vassalos, e de todo o meu reino, fiz mia manda per que, de pós mia morte, mia molher e meus filhos e meu reino e meus vassalos e todas aquelas cousas que Deus mi deu eu poder esten eu paz e en folgança (...)”.

Confrontando os três textos em análise, verifica-se que, do ensaio dos primeiros passos na poesia, a prosa aparece já um pouco mais evoluída. Mas, é sem dúvida no testamento de D. Afonso II que a linguagem aparece de feição mais parecida com o português

Como é sabido, em 24 de junho de 2028, comemora-se os 900 anos da Batalha de S. Mamede, facto histórico considerado o mais adequado para celebrar a Fundação de Portugal. Ora, tendo Portugal e os países da lusofonia uma língua comum, justificará um convite especial a todos esses povos irmãos a fim de participarem, juntamente com Portugal, nas respetivas celebrações centenárias.


Autor: Narciso Machado
DM

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5 maio 2021