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Comemoração da fundação de Portugal

De Guimarães o campo se tingia

Co’sangue próprio da intestina Guerra

Onde a mãe, que tão pouco o parecia,

A seu filho negava o amor e a terra.

Com ele posta em campo já se via,

E não vê a soberba o muito que erra

Contra Deus, contra o maternal amor,

Mas nela o sensual era maior”.

(Camões - in Os Lusíadas .canto III-31)

Era de 1166 (1128): no mês de junho, festa de S. João Batista, o ínclito infante Afonso travou com eles, indignos estrangeiros da nação, combate no campo de S. Mamede, próximo do castelo de Guimarães. Venceu-os e prendeu-os na sua fuga…” (In “Crónica dos Godos” – séc. XII).

Num feriado apenas municipal, os vimaranenses comemoram mais um aniversário da Batalha de S. Mamede, ocorrida no dia 24 de Junho de 1128 (da era cristã) e considerada como o primeiro ato da Fundação de Portugal, já que a derrota do infante Afonso, nessa batalha, representaria a perda, sem remissão, da causa nacional.

Em aniversários anteriores, abordei a figura de D. Afonso Henriques, como militar e político (PUBLICO – 10.6.15). Agora pretendo recordá-lo como “pio, beato e santo” e como diplomata.

Recorde-se que os monges de Santa Cruz de Coimbra e de Alcobaça, cujos mosteiros D. Afonso Henriques ajudou a fundar, sempre assumiram a incubência e a responsabilidade de cultivar a sua memória, promovendo a sua beatificação junto da Cúria Romana.

Em 1728, o padre José Pinto Pereira publicou, em Roma, um livro a que chamou “Apparatus Historicus…” onde apresenta dez argumentos para comprovar a santidade de D. Afonso Henriques., obtendo o apoio do rei D. joão V. A esta face acumula-se uma outra, igualmente importante: a dediplomata.

O Vaticano foi o primeiro Estado a reconhecer Portugal como uma nação independente. Tal facto deve-se a D. Afonso Henriques e à sua diplomacia. Na verdade, além de um exímio militar e político, D. Afonso Henriques foi também um excelente diplomata.

Na tentativa de se libertar dos laços de vassalagem que o ligava a Leão e Castela e obter a garantia e consolidação do Reino, o nosso primeiro monarca promoveu imensas diligências no sentido da constituição de uma vassalagem ao Papa Inocência II, o que fez em 1143, nas mãos do Cardeal Guido de Vico, encomendando o território português a S. Pedro e à Igreja Romana.

Documentando esse ato de enfeudamento, D. Afonso Henriques dirige à Cúria Romana, em 13 de Dezembro de 1143, a carta Claves Regni Coelorum, prometendo um tributo anual de quatro onças de ouro, mas pondo como condição de “gozar da proteção papal, para si a para a dgnidade e categoria de reino e não reconhecer qualquer senhorio espiritual ou temporal, exceto o papa e seus delegados.

Na conquista do reconhecimento papal da independência do reino, D. Afonso Henriques teve a ajuda preciosa do arcebispo de Braga, D. João Peculiar, que chegou ir a Roma umas seis vezes.

D. Afonso Henriques promoveu, simultaneamente, a constituição de uma Igreja nacional dependente da primazia bracarense e não de Toledo.

Nessa altura, a Cúria Romana dava a D. Afonso Henriques o título de “dux”. Apenas em 1179, no pontificado de Alexandre III, é que a existência do reino de Portugal e a dignidade real de D. Afonso Henriques foram reconhecidas pela bula “Manifestis Probatum est”, emitida a 23 de Maio daquele ano.

Por este diploma, o Papa Inocência III, “considerando D. Afonso Henriques pessoa provida de prudência e dotado de justiça e idóneo para um governo de um povo, aceita-o, e aos seus sucessores, sob a proteção papal e de S. Pedro, com a dignidade do reino, com todas as terras que, com o auxílio da Graça Celeste, ganhar aos sarracenos…”

Com se vê, pelo citado documento, D. Afonso Henriques passou a ser considerado rei e Portugal um reino independente. Por esta razão, a comemoração da Batalha de S. Mamede, representando a fundação de Portugal, bem merecia um feriado nacional, facto que os vimaranenses reclamam há longos anos e bem poderia ter o apoio da atual Presidente da República.


Autor: Narciso Machado
DM

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23 junho 2018